São Paulo, quarta-feira, 17 de outubro de 2007

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GILBERTO DIMENSTEIN

Manual de sobrevivência em São Paulo


Ivo está convencido de que os bairros serão valorizados como espaços combinados de trabalho e moradia

O DESIGNER GRÁFICO IVO MINKOVICIUS faz parte daquele numeroso grupo de pessoas que investiram o que tinham e perderam o que não tinham na década de 90, apostando no "boom" do mercado da internet. Como muitos, montou um escritório, mas faliu.
Precisava começar de novo e, para economizar, decidiu trabalhar em seu apartamento. A decisão provocou-lhe uma série de temores que iam desde as demandas da família -e do animal doméstico- até os ataques incessantes à geladeira para descarregar a ansiedade do trabalho.
Para sobreviver, desenvolveu um meio de se organizar -e cunhou a expressão "estratégia urbana".
Passados 12 anos daquela derrocada, Ivo, agora com 42 anos, recuperou os negócios. Poderia, portanto, montar seu escritório. "Nem pensar." O que era um problema transformou-se, para ele, numa solução. "Ganhei muito tempo." Dentre os projetos que estão na sua mesa, um é detalhar seu aprendizado de estratégia urbana numa espécie de manual de sobrevivência em São Paulo.
"Consegui fazer da cidade, ao mesmo tempo, uma metrópole e uma província."

 


Formado em arquitetura pela USP, Ivo está convencido de que, cada vez mais, os bairros serão valorizados como espaços combinados de trabalho e moradia. "Não vejo condição de o trânsito melhorar tão cedo."
Na sua "estratégia urbana", o indivíduo deve mapear rigorosamente todas as possibilidades no bairro e evitar pegar o carro. Precisa conhecer todos os serviços de entrega, inclusive os pela internet. São poucas as exceções que ele faz. Uma delas é usar o carro para buscar uma areia sanitária especial para seu gato nas proximidades da Vila Leopoldina -"mas faço isso uma vez a cada três meses"- e para ir até Pinheiros, onde tem sessões de medicina oriental.

 


Mais importante do que equipar o escritório de sua casa com conexão rápida foi a disciplina para evitar o ataque à geladeira ou a interrupção do trabalho para ficar ouvindo música deitado na sala. Em sua rotina, estão corridas pela praça Buenos Aires e natação numa academia. Exercitar-se é, na visão dele, uma tática essencial na sua estratégia urbana para contrabalançar o excesso de tempo em casa, tomar contato com pessoas e manter a forma.
A disciplina implicou estabelecer regras em conjunto com a família para que não fosse chamado para apartar briga dos filhos ou resolver o problema da lâmpada apagada. Até a escolha do animal doméstico deve ser considerada. "Adoro cachorro, mas achei que os passeios com o bichinho iam sobrar para mim." Preferiu a autonomia do gato que, não fosse pela tal areia, não o faria locomover-se de carro.

 


Um detalhe fundamental do êxito da estratégia e da vontade de trabalhar em casa é fruto da sorte. Pouco depois de fazer o escritório em seu apartamento, foi construído, bem na sua frente, um shopping, onde faz as reuniões de trabalho num café.
Ser profissional liberal e morar em Higienópolis, em frente a um shopping, são duas coisas que facilitam obviamente a vida de qualquer um, mas, diz ele, todos podem reaprender a lidar com São Paulo.

gdimen@uol.com.br


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