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São Paulo, quarta-feira, 17 de dezembro de 2003

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SEGURANÇA

Esclarecimento de dois casos revela preferência por vítimas de classe média alta; valor médio dos resgates é de R$ 10 mil

Quadrilhas mudam alvo de sequestro em SP

GILMAR PENTEADO
DA REPORTAGEM LOCAL

O fim de dois sequestros ontem em São Paulo -o de um estudante de 17 anos que teve um dedo da mão decepado e o de uma empresária de 27 anos- revelou os detalhes de uma nova fase desse tipo de crime, que apresenta queda nas estatísticas oficiais.
Vítimas pertencentes à classe média alta são o alvo principal dos grupos de sequestradores, formados por foragidos da prisão e novos líderes de quadrilha.
Depois da banalização dos sequestros, com números recordes em 2001 e 2002, o crime teve redução drástica neste ano, mas ainda apresenta registros acima de 2000. De outubro de 2003 até ontem, foram 26 sequestros. Quatro ainda estão em andamento.
De outubro a dezembro de 2002, foram 52 casos, contra 127 no mesmo período do ano anterior. Em 2000, o quarto trimestre registrou 15 casos.
Os dois sequestros resolvidos ontem pela polícia podem ser considerados exemplos da nova fase desse tipo de crime, segundo o diretor da DAS (Divisão Anti-Sequestro), Wagner Giudice.
As novas características estão no perfil das vítimas e dos sequestradores e na atuação dos bandidos. Na banalização dos sequestros, pessoas de classe média e até baixa passaram a ser vítimas.
Com a redução das estatísticas, o nível econômico das vítimas subiu, mas nem só os ricos têm razão para se preocupar. "Isso ficou mais nivelado. A maioria das vítimas pertence à classe média alta", disse Giudice.
Só que na maior parte dos sequestros, o resgate não é pago e, nos casos em que os sequestradores receberam dinheiro, os valores não são altos. "A média dos resgates pagos é de R$ 10 mil", disse o delegado. Segundo ele, as vítimas também não são mais escolhidas aleatoriamente, como ocorria durante o recorde do número de casos. "O sequestro está mais longo, o sequestrador está estudando melhor a vítima e está mais cauteloso", disse.
O sequestro do jovem, libertado ontem, segue esse perfil. O jovem ficou 74 dias em um cativeiro na zona leste e só foi libertado porque a polícia prendeu Willian Franklin de Freitas Vargas, 24, o Willian Fantasma, foragido da cadeia, que seria o mentor do crime. Ele também é suspeito de participar de mais seis sequestros.
Depois de preso, Willian Fantasma ligou para os outros sequestradores -três menores de idade, segundo a polícia- e ordenou que o adolescente fosse solto. O jovem foi liberado na madrugada de ontem, sem que o resgate de US$ 500 mil fosse pago.
A quadrilha mandou o dedo à família do garoto na sexta-feira. O grupo teria usado analgésico no momento de decepar o dedo e depois deu antiinflamatórios e antibióticos ao jovem, filho de um dono de postos de gasolina.
A outra vítima resgatada ontem é dona de uma farmácia nos Jardins (zona oeste). Ela ficou um dia no cativeiro e foi resgatada devido a uma informação passada ao Disque-Denúncia. A quadrilha tinha pedido resgate de R$ 500 mil. Ninguém foi preso.
"Os sequestradores de hoje são foragidos da cadeia ou bandidos que pertenciam ao segundo escalão das quadrilhas e subiram na hierarquia com a prisão dos líderes", disse Giudice.
Segundo ele, existe hoje cerca de 15 homens na rua que têm experiência em sequestro e fazem contato com várias quadrilhas -principalmente ladrões de banco- para cometer esse tipo de crime em São Paulo.
Nessa lista, estão foragidos da cadeia e novos líderes que tomaram lugar dos sequestradores presos. Na fuga em massa da Penitenciária do Estado, no complexo do Carandiru, no dia 9 de novembro, pelos menos seis sequestradores conseguiram escapar. Cinco deles tinham sido presos pela própria Divisão Anti-Sequestro, segundo Giudice.
Um desses foragidos, Fábio Fernandes da Silva, também teria dado apoio no sequestro do adolescente, que já estava em andamento quando ele conseguiu escapar por um túnel da penitenciária. A sua participação foi informada à polícia por Willian Fantasma, que teria confessado o crime.
A polícia também afirma que os sequestradores estão mais cautelosos e buscam meios para burlar a investigação policial. Willian Fantasma, por exemplo, contava com o apoio de Ítalo Antonio dos Santos de quem comprava telefones celulares clonados.
Os aparelhos eram usados para contatos entre os membros da quadrilha e pedidos de resgate, e depois eram descartados para confundir a polícia. "Isso dificultou muito o trabalho no caso do adolescente", disse Giudice.
Foi por intermédio de Santos, preso na semana passada, que a polícia descobriu a participação de Willian Fantasma. Segundo anotações encontradas em sua casa, Santos tinha mais de 500 celulares clonados. Cada aparelho era vendido a R$ 100.


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