São Paulo, domingo, 17 de dezembro de 2006

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OPINIÃO

Fundeb: solução ou paliativo?

Essa será a nossa "escolha de Sofia": continuar privilegiando uma parte dos nossos aposentados -o passado- ou investir nas nossas crianças- o futuro

SONIA PENIN
ESPECIAL PARA A FOLHA

SUCESSOR do Fundef, o Fundeb estendeu aos ensinos médio e infantil o mecanismo de juntar verba da União ao gasto obrigatório de Estados e municípios com a educação. Dada a diversidade nacional, espera-se que a proposta, assegurando o devido montante ao ensino fundamental, não engesse a decisão dos governos estaduais e municipais sobre como usar o recurso. Dessas instâncias espera-se um plano para universalizar com qualidade os ensinos fundamental, médio e infantil, com avaliação.
O Fundeb considera demandas sociais. O ensino médio é ambição de jovens, que buscam de forma dramática a inserção no mundo do trabalho ou continuidade de estudo. Igualmente é aspiração da sociedade, que necessita de mais estudantes no ensino superior, construtores do desenvolvimento sustentável.
Por outro lado, a educação infantil amplia as referências culturais das crianças, prenunciando uma escolarização mais fluida, além de facilitar a vida das mães trabalhadoras.
A melhoria da educação básica apóia-se na valorização do professor, com salário justo, carreira atraente e formação continuada qualificada. A dificuldade em lidar com a diferenciação entre os alunos e demandas contemporâneas exige interlocução para os professores. Soluções para lidar com as conseqüências negativas da rotatividade e do absenteísmo carecem de discussão. Tempo integral, número de alunos por classe, materiais didáticos específicos e de informática e prédios escolares erguidos com funcionalidade e parcimônia precisam ser considerados.
O Fundeb é transitório, necessário, mas o país clama pela superação radical da desigualdade. A ampliação da verba, vis-à-vis o aumento do número de alunos atendidos, será suficiente para desatar problemas arraigados? Não está claro o impacto que a rearquitetura do Fundeb terá na fatia da educação no PIB nacional. Solver a dívida histórica pressupõe alargar a porcentagem da educação para além de 4,5% do PIB.
Há de se atuar sobre o cerne da injusta distribuição do Orçamento: 13,7% para a Previdência, 7,5% para a saúde, 7% para juros, 4,5% para a educação, 4,25% para superávit primário, 4,25% para todos os outros setores. Como elevar imposto é insustentável, o Brasil tem uma das mais elevadas taxações (38% do PIB, a média de países em desenvolvimento é 20%-25%), há que se repensar essa distribuição.
Além da evidente necessidade de reduzir os juros, urge examinar o caso da Previdência, cujo gasto é muito superior à média mundial de 6%, mas cuja diminuição não pode atingir a maioria da população trabalhadora que ganha ínfima aposentadoria, e sim setores privilegiados -Forças Armadas, Legislativo, algumas áreas do Executivo e o Judiciário (lembrando que no passado o ganho do professor era semelhante ao de juízes).
Se outra solução não se apresentar, essa será a nossa "escolha de Sofia": continuar privilegiando parte dos nossos aposentados, o passado, ou investir nas nossas crianças, o futuro.


SONIA PENIN é diretora da Faculdade de Educação da USP

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