São Paulo, terça-feira, 18 de janeiro de 2005

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CRIME ORGANIZADO

Relatório do Judiciário aponta atuação do Comando Vermelho em presídios na Região Metropolitana de Vitória

Espírito Santo é novo alvo de facções do Rio

SILVIO NAVARRO
DA AGÊNCIA FOLHA, EM VITÓRIA

Distante pouco mais de 500 km da cidade do Rio de Janeiro, a área metropolitana de Vitória (ES) abriga um braço do narcotráfico fluminense. A presença nos morros capixabas de integrantes de facções e quadrilhas ligadas ao tráfico no Rio já foi detectada pelos serviços de inteligência da Polícia Militar e da Polícia Civil.
Na quinta-feira, 20 homens armados invadiram os becos do bairro da Penha, em Vitória, numa disputa por pontos-de-venda de drogas. A caçada terminou com três traficantes mortos e dois gravemente feridos.
O comércio fechou as portas. À noite, houve troca de tiros com a polícia. Para investigadores do DHPP (Divisão de Homicídios e Proteção à Pessoa), foi uma tentativa de tomada das "bocas-de-fumo" por traficantes do Rio.
Há cerca de 50 dias, a polícia vinculou a onda de violência, cujo ápice foi o incêndio de dez ônibus em diferentes pontos da região metropolitana, a integrantes da facção criminosa CV (Comando Vermelho) presos no Estado. A ordem para os atentados, segundo conclusão da polícia, viera de dentro dos presídios capixabas, onde surgem subfacções que se identificam com o grupo do Rio.
"Temos vários internos no Espírito Santo que são presos do Rio de Janeiro. Vieram de lá por assalto a banco e por ações no tráfico e cumprem penas aqui. Há internos que eram instrutores do pessoal do CV. São ex-fuzileiros navais que davam instrução de uso de armamento pesado para membros do CV no Rio", afirma o juiz da 5ª Vara de Execuções Penais, Carlos Eduardo Ribeiro Lemos, que elaborou um relatório após inspeção nos presídios da Grande Vitória. O documento, ao qual a Folha teve acesso, foi encaminhado ao governador Paulo Hartung (sem partido) e ao Ministério Público Estadual.
No ano passado, a polícia encontrou ainda uma granada num morro capixaba com a inscrição "CV". Do lado de fora dos presídios, outra constatação feita pela polícia aproxima o tráfico de drogas fluminense e capixaba. Há uma relação de proteção aos traficantes, que pagam carros de som para eventos religiosos, compram remédios e suprem necessidades da população carente como nos morros do Rio.
O secretário da Segurança, Rodney Miranda, admite a ação de traficantes cariocas na Grande Vitória, mas afirma ser "prematuro dizer que o CV atua no Estado". "Aqui o tráfico não tem xerife, e os [mentores] que havia mandamos para fora do Estado depois do atentado contra os ônibus."
Ainda de acordo com o secretário, tentou-se criar um braço do CV no Espírito Santo com a formação de uma facção denominada Primeiro Comando Guaranhuns (nome de um bairro do município de Serra).
O líder do grupo, que, segundo a polícia, fazia parte da lista de mandantes dos atentados contra os ônibus, Fernando Cabeção, foi transferido para o Nordeste.
O traficante foi um dos envolvidos na morte do juiz Alexandre Martins de Castro Filho, que atuava no combate ao tráfico de drogas, em 2003.
O secretário da Justiça, Fernando Zardini, diz que a ação do narcotráfico capixaba "guarda uma relação no formato" com a do Rio. A diferença, para o titular da Segurança, "é que (no Espírito Santo) não há lugar, não há morro, onde a polícia não entra".

Reforço na segurança
O secretário da Justiça admite que o "embrião dessas atividades" esteja no interior dos presídios, mas afirma que o Estado intensificou as obras de reforço da segurança no setor penitenciário.
"Não vejo riscos de uma nova onda de violência como aquela [atentados a ônibus, em novembro de 2004]. Houve ações do governo estadual e federal para não acontecer como no Rio. O momento é de estabilidade", afirmou o secretário.
O secretário da Segurança afirma que o Estado investiu nos segmentos de polícia técnica e científica e pretende criar neste ano um grupo especial para "intervir nesse tipo de crise".
Para o promotor Marcelo Lemos, coordenador do GRCO (Grupo de Repressão ao Crime Organizado), o Estado não tem estrutura para a condução de investigações sobre o narcotráfico.
Também disputam espaço no comércio de drogas no Espírito Santo traficantes que vêm de Minas Gerais e do sul do Bahia. Para o secretário da Segurança capixaba, "o narcotráfico não tem fronteiras. Há alguém fornecendo em atacado, porque o Estado não é produtor de entorpecentes".

Levantamento
Os secretários da Segurança e da Justiça afirmaram que as duas pastas elaboram em conjunto um levantamento sobre a atuação dos grupos e quadrilhas dentro e fora dos presídios da região.
O mapeamento, segundo Miranda, deverá estar pronto em fevereiro. Um dos fatores que dificulta o trabalho é o cadastro obsoleto dos presos. Boa parte dos prontuários não tem fotos e apresenta dados incompletos.
No trabalho de mapeamento, a Secretaria da Segurança aponta dois bairros emblemáticos de Vitória -São Pedro e Ilha do Príncipe-, onde a maioria dos homicídios está diretamente relacionada ao narcotráfico.


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