São Paulo, sexta-feira, 18 de fevereiro de 2005

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JUVENTUDE ENCARCERADA

Secretário diz que funcionários não acumularão funções de educador e segurança

Alckmin demite 1.751 monitores da Febem e faz contratação emergencial

Diego Padgurschi/Folha Imagem
Funcionários da Febem consultam lista de demitidos depois de serem barrados na entrada do complexo Tatuapé (zona leste)


VICTOR RAMOS
DA REPORTAGEM LOCAL

O governo Geraldo Alckmin (PSDB-SP) anunciou ontem a demissão em massa de 1.751 funcionários da Febem (Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor) que ocupavam o cargo de agente de apoio técnico -os chamados monitores.
O cargo de agente de apoio técnico foi extinto por decreto em 18 de janeiro, mas nem todos os monitores foram demitidos -a medida atingiu os que atuavam em unidades da capital e da Grande São Paulo. Para o lugar deles foram contratados, em caráter emergencial, 1.606 agentes de segurança e 773 educadores sociais.
A Febem é um dos maiores focos de problemas de Alckmin -citado como possível presidenciável em 2006. A instituição é freqüentemente relacionada a casos de tortura, rebeliões e fugas.
De acordo com Alexandre de Moraes, secretário estadual da Justiça e presidente da Febem, a medida visa separar, nos grandes complexos, as funções de segurança e de educador. "Tínhamos uma mesma pessoa exercendo as duas funções. E ela acabava não fazendo nem uma, nem outra", disse o secretário. Para Moraes, essa sobreposição de funções criou uma estrutura viciada.
Em entrevista dada à Folha no final de janeiro, Alexandre de Moraes afirmou que havia uma "banda podre" entre os funcionários da Febem e que o governo iria "mapeá-los e demiti-los". No entanto, os agentes demitidos ontem não são os acusados de torturar adolescentes. Estes receberão demissão por "justa causa" nos próximos dias.
As demissões foram anunciadas pouco mais de um mês depois que o secretário constatou, em visita à unidade de Vila Maria, o espancamento de internos por parte de funcionários. Na ocasião, 16 agentes foram presos na hora e outros sete tiveram a prisão temporária decretada.
Foram demitidos ontem monitores nos complexos de internação Tatuapé, Vila Maria, Raposo Tavares, Brás e Franco da Rocha. A maior parte dos funcionários só ficou sabendo da medida ao chegar ao trabalho.
Organizações que defendem os jovens elogiaram a iniciativa, mas fizeram ressalvas. ""Somente mudar peças não vai acabar com vícios de décadas", disse Eloisa Machado, 26, advogada da ONG Conectas que defende interesses de famílias de internos da Febem. ""É preciso mudar em outros âmbitos, acabar com a lógica de tortura, omissão e violência."
Para o advogado Ariel de Castro Alves, coordenador estadual da ONG Movimento Nacional de Direitos Humanos, é preciso manter a política de punir funcionários infratores. Max Dante, da ONG Travessia, elogia a reforma na Febem, mas diz temer que o processo esteja sendo conduzido de forma muito rápida, com atropelos.
O governo vai abrir concurso público para os cargos que foram ocupados emergencialmente. Para disputar as 773 vagas de educadores, será exigido curso superior. Para as 1.606 vagas de agentes de segurança, bastará o ensino médio. Dos antigos agentes, exigia-se apenas o ensino fundamental (antigo primeiro grau).
Alexandre de Morais também anunciou a implantação do programa "Mães na Febem", que prevê a presença de parentes nas unidades de internação. Outro programa permitirá a atuação de ONGs na fundação. Um terceiro, facultativo aos adolescentes internos, terá como foco a participação de religiosos.

Espancamento e fuga
Um adolescente do complexo Tatuapé da Febem foi espancado por outros internos ontem. A vítima foi internada em estado grave no Hospital das Clínicas. O adolescente estava isolado no "seguro", onde ficam os jurados de morte, quando o local foi invadido pelos demais internos.
A assessoria da Febem, citando testemunhas do espancamento, disse que a chave do local foi entregue aos agressores por um funcionário que, na véspera, soube que seria demitido.
Por volta das 17h30 de ontem, cerca de 30 internos do complexo de Franco da Rocha fugiram -três deles foram recapturados. Segundo a assessoria da Febem, eles passavam por atendimento médico na unidade e renderam o vigia. O complexo tem capacidade para 280 internos e abrigava 302 antes da fuga.

Colaboraram ALEXANDRE HISAYASU e JOSÉ ERNESTO CREDENDIO, da Reportagem Local

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