São Paulo, domingo, 18 de junho de 2006

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"Grau de heterossexualidade" veta policial

Aprovado em concurso da PF, delegado, que desbaratou esquadrão da morte, foi considerado inapto no teste psicotécnico

Escala mede a quantidade de energia que a pessoa desprende para o sexo, indicativo de predisposição para o trabalho e a fadiga

THIAGO REIS
DA AGÊNCIA FOLHA

Um delegado da Polícia Civil do Espírito Santo, conhecido por desbaratar um esquadrão da morte que agia no Estado, tenta ingressar na Polícia Federal há dez anos, sem sucesso. Aprovado na primeira fase de um concurso realizado em 1993, ele foi tido como inapto por não atingir um "determinado grau de heterossexualidade" no teste psicotécnico.
Em 1996, quando os candidatos foram nomeados, ele não foi relacionado mesmo tendo obtido média final de 8,177 no curso de formação e se classificado em 90º lugar. Eram 200 vagas.
Francisco Vicente Badenes Jr., que se declara heterossexual, entrou com dois recursos -ambos negados. Em 2000, entrou com uma ação ordinária para fazer valer o resultado. Em 2002, um despacho do ministro Miguel Reale Jr. reconheceu que o teste não era válido. Mas só em de maio o juiz substituto da 1ª Vara Federal de Brasília, Marcelo Rebello Pinheiro, deferiu a liminar.
A Folha tentou contato com Badenes. Com o paradeiro sob sigilo, já que foi perseguido e hoje faz parte do programa de proteção a pessoas ameaçadas, não foi achado. Por meio de uma ex-advogada dele, a reportagem obteve uma resposta: "Ele avisa que a liminar foi cassada, mas que a decisão ainda não foi publicada". É a mais nova derrota jurídica.
O exame aplicado na PF, chamado de EPPS (Escala de preferência pessoal de Edwards, na sigla em inglês), é considerado pelo Conselho Federal de Psicologia "sem condições de uso para avaliação psicológica".
Segundo o psicólogo Ricardo Primi, o teste se baseia em frases, às quais o candidato diz se concorda.
Para a PF, não se trata de discriminação, pois a escala de heterossexualidade não indica a opção sexual. A PF diz que mantém o argumento anexado ao processo, de que a escala é uma forma de mensurar a quantidade de energia que o indivíduo desprende para o sexo -um indicativo de sua predisposição para o trabalho, persistência, produtividade e resistência à fadiga e à frustração.
Entretanto, foi justamente por um trabalho "extremamente árduo e corajoso, face à magnitude da organização criminosa combatida [a Scuderie Le Cocq]", nas palavras da AIP (Associação Internacional de Polícia), que ele foi indicado para receber em setembro, na Eslovênia, um prêmio.
O exame do grau de heterossexualidade não é mais aplicado no teste psicotécnico. Um novo sistema de avaliação entrou em vigor em 2003.


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