São Paulo, domingo, 18 de setembro de 2005

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DANUZA LEÃO

A tal da maturidade

A gente nasce criança, vira adolescente, depois adulto, e é condenada à tal da maturidade, queira ou não.
É uma obrigação, por assim dizer, e ser chamada de imatura depois dos 40 é praticamente uma ofensa. Se dito por grandes amigos, pode até ter uma conotação carinhosa: que para você o tempo não passa, que continua a mesma criança de 20 anos atrás. Um elogio, mas no qual vem embutida uma censura do tipo "nela não se pode confiar". Uma criança, sabe como é: uma delícia para passar umas horas, mas sempre uma criança. Falando mais claro: um ser imaturo é, basicamente, irresponsável. E quem confia num ser irresponsável, seja para dar um emprego, dar o antibiótico de quatro em quatro horas ou entregar o coração?
E a gente se pergunta: afinal, para que crescer, para que ser adulto? Com a maturidade chegam as responsabilidades; você passa a ser responsável por sua vida, por suas opções e, mais tarde, pela vida dos filhos, tomando decisões das quais não tem nenhuma certeza, por obrigação. E, quando esses filhos crescem e têm seus próprios filhos, é possível que você seja chamada, pelo menos para dar uma opinião -afinal, se foi difícil para você amadurecer, para eles também é. Para quem apelar? Para você, é claro, que tem -ou deveria ter- as respostas certas para todas as perguntas.
Ah, os filhos; como eles sabem pouco de nós. Não sabem que nossos cabelos brancos não querem dizer nada e que temos tantas dúvidas quanto eles. Como saber se é melhor abrir mão de um excelente trabalho em troca de outro que privilegia a qualidade de vida? Aliás, o que é qualidade de vida?
Ter tempo para ouvir o canto dos passarinhos, ouvir música clássica e ler?
Uma mulher madura tem a obrigação de tomar suas decisões, e sozinha. Detalhe: decidir sozinha significa se responsabilizar pelas conseqüências de seus atos, e é sempre preciso fazer uma escolha: faz a reforma da cozinha ou uma viagem? Troca o computador ou manda forrar o sofá da sala? Divide com os filhos, generosamente, uma grana que pintou, ou pensa que eles têm muito mais vida pela frente do que você e dá uma puxadinha na cara? E como saber?
Ninguém imagina do quanto ela precisa de alguém que -simbolicamente- segure sua mão para atravessar a rua, como quando era pequena; que segure sua mão para atravessar a vida, que é mais perigosa do que qualquer esquina na hora do rush. De alguém que diga que, se continuar sem comer -com essa mania de magreza-, vai acabar doente; de alguém que telefone e diga para sua empregada para cuidar de sua alimentação. Lembra de como você ficava com raiva quando isso acontecia? "Você pensa que eu ainda sou criança, para me controlar?" Pois é.
Também seria bom ter um outro alguém, um alguém que perguntasse se você lembrou de fazer o Imposto de Renda, que se propõe a mandar o boy pagar aquela conta no banco, e que dissesse, com a maior segurança, que você pode trocar o apartamento por um mais caro; que se, na pior das hipóteses, não conseguir vender o antigo a tempo, ele adianta o dinheiro e você paga depois. Ah, e que lembrasse de que é preciso mandar registrar a escritura.
Porque só se amadurece quando não se tem com quem contar; quando não se tem mais pai e mãe.
É a maturidade que faz as pessoas ficarem velhas, mas você já reparou que existem outras que vão ficando cada vez mais jovens?
O que me faz pensar que, no fundo, é apenas uma questão de escolha.


E-mail - danuza.leao@uol.com.br

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