São Paulo, quarta-feira, 18 de outubro de 2000

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SAÚDE
Têm sido atendidos diariamente em Feijó de 30 a 50 pacientes com sintomas de contaminação, como diarréia e febre
Rotavírus já matou 15 crianças no Acre

EDUARDO SCOLESE
DA AGÊNCIA FOLHA

Pelo menos 15 crianças já morreram neste mês, em Feijó (AC), contaminadas pelo rotavírus -um dos principais causadores de diarréia viral e gastroenterite (inflamação simultânea do estômago e dos intestinos) e que atinge na maioria das vezes crianças menores de cinco anos.
O Hospital Municipal de Feijó, o único da cidade, tem atendido diariamente de 30 a 50 crianças que apresentam algum dos sintomas desse vírus -como diarréia, vômito, febre alta, náusea e cólica.
Das cerca de 1.500 crianças que foram examinadas no hospital desde o início de setembro devido ao rotavírus, ao menos 60 delas -em estado grave de desidratação- tiveram de permanecer internadas por alguns dias.
O rotavírus se alastra pelo ar e pela água e só pode ser combatido por meio de hidratação. As crianças morrem porque perdem muita água em pouco tempo. O leite materno e o soro caseiro seriam suficientes para protegê-las da desidratação causada pelo vírus.
Jackson Vaz, um dos dois únicos médicos da cidade credenciados pela Secretaria Estadual da Saúde, afirma que a maioria das crianças que morreram desidratadas tinha menos de um ano.
"Aqui em Feijó, as mães não têm o hábito de amamentar seus filhos. É um problema cultural que acaba aumentando a epidemia. Por isso, após serem contaminadas, as crianças acabam morrendo desidratadas."
Na opinião de Vaz, que está no Acre há apenas dois meses, a dificuldade para a contenção da epidemia se resume ao fato de cerca de 95% dos 23 mil habitantes da cidade não receberem água tratada em suas residências.
"As crianças vivem diariamente em contato com as águas contaminadas, principalmente na zona rural, onde vive pelo menos 70% da população do município e o transporte é feito quase que sempre por meio de barcos."

Aglomerações
Para o diretor do departamento de ações básicas de saúde da Secretaria Estadual da Saúde, Amsterdã Sandres, os períodos em que o centro da cidade recebe mais pessoas do que o normal, como em dias de eleições, podem agravar o alastramento do vírus.
"Os moradores da zona rural vêm votar na cidade, ficam um ou dois dias aglomerados em locais de pouca higiene e depois voltam contaminados aos seus vilarejos."
De acordo com Sandres, muitas crianças morrem devido à falta de orientação de seus pais, que na maioria da vezes preferem levar o filho contaminado a uma rezadeira e não ao médico.
"As crianças contaminadas pelo vírus passam dias e dias com curandeiros e benzedeiros. Quando os pais percebem que o caminho correto é a medicina, já é tarde demais. Elas (as crianças) chegam ao hospital no último estágio da desidratação e com pouquíssimas chances de cura."
Na opinião de Sandres, por opção das famílias, a maioria das crianças mortas nem chegou a ser diagnosticada.
"A cidade enfrenta um problema cultural muito sério, que mesmo com maiores investimentos nas áreas básicas de saúde não seria resolvido a curto ou médio prazo. Deve-se investir em tudo, mas principalmente na educação."


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