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Hipótese difundida pela indústria omite que o ar do fumante e o do não-fumante se misturam na central de ar condicionado
Não existe sistema de circulação seguro
DA REPORTAGEM LOCAL
Não existe nenhum sistema de
circulação de ar que permita a
convivência de fumantes e não-fumantes em ambientes fechados
sem trazer riscos.
A razão é simples, segundo Luiz
Fernando de Góes Siqueira, 48,
professor da Faculdade de Saúde
Pública da USP e ex-presidente da
Sociedade Brasileira de Meio Ambiente e Controle da Qualidade do
Ar de Interiores: o ar do fumante e
o do não-fumante se misturam na
central de ar condicionado.
Na América Latina, a indústria
difundiu a idéia errônea de que
sistemas de ventilação adequados
seriam a solução para permitir a
convivência de fumantes e não-fumantes no mesmo ambiente.
"Esse sistema é uma falácia porque não consegue renovar 100%
do ar, mas no máximo 25%."
O cigarro, diz ele, é o principal
poluente de matéria particulada.
O tamanho de suas partículas,
que são cancerígenas, equivale a
um milésimo da cabeça de um alfinete. Segundo o relatório da
Opas (Organização Pan-Americana de Saúde) sobre o Projeto
Latino da indústria, o uso de sistemas de ventilação para melhora
da qualidade do ar de interiores é
inócuo quando há fumaça de cigarro. Não há um nível de exposição à nicotina seguro.
A única forma de evitar a poluição do cigarro é segregar o fumante, diz o pneumologista José
Rosemberg, professor aposentado da Faculdade de Medicina da
PUC e um dos principais pesquisadores de tabagismo no país.
As companhias de cigarro também investiram em campanhas
de "tolerância" ao fumo, cujo alvo
eram os donos de restaurantes,
bares e hotéis. Apregoavam que a
exposição ao fumo é uma questão
de preferência, não de saúde.
Rosemberg dá dois exemplos
do poder de contaminação da nicotina: "Num prédio de oito andares, se alguém fumar, você encontrará nicotina em todo o prédio. Se um pai fumar na sala de
jantar e um filho estiver dormindo no quarto, a dez metros de distância, dá para detectar nicotina
na urina da criança".
Para que um componente como
esse fosse detectado em "níveis
mínimos" ou "insignificantes",
como repetem os estudos patrocinados pela indústria, os pesquisadores usavam um método fraudulento, segundo Joaquin Barnoya, da Universidade da Califórnia
em San Francisco: "Eles faziam as
medições em horários em que os
prédios estavam vazios".
Trabalho de 1995 sobre a qualidade do ar em escritórios e restaurantes do Rio e de São Paulo, dirigido por Antonio Horácio Miguel, professor do Instituto de
Química da USP à época, privilegiou churrascarias e pizzarias que
usavam lenha. A fumaça da madeira camuflava os níveis de nicotina, de acordo com Barnoya.
Há falhas metodológicas primárias, na avaliação de James Repace, especialista em fumo passivo.
Em nenhum dos locais pesquisados no Rio e em São Paulo há o
número médio de fumantes. A
contabilidade só é feita em horário de pico.
Repace estranhou também os
níveis de nicotina apontados no
estudo. Num escritório americano com 283 m3, onde três fumantes consomem dois cigarros por
hora, a concentração de nicotina é
de 15 microgramas por metro cúbico. Num escritório no Rio, o estudo encontrou só um décimo
dessa concentração.
No Chile, o toxicologista Lionel
Gil, da Universidade do Chile,
propôs fazer o levantamento na
época em que a poluição em Santiago é mais alta, o que ajudaria a
mascarar os níveis de nicotina.
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