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DANUZA LEÃO
O fim do amor
Não há nada mais complicado na vida do que a relação homem/mulher, e esse novo
Código Civil veio para confundir
ainda mais, com a tal da relação
estável.
O que é mesmo uma relação estável? Em se tratando de sentimentos, a instabilidade está sempre presente, e quando se trata de
namoro, a coisa pega mesmo.
A mulher, sempre cheia de esperanças em relação a um possível
futuro casamento, tende sempre a
achar que a relação é estável; só
que o sexo masculino é diferente.
Quantas vezes você perguntou a
uma amiga -que viu algumas
vezes com o mesmo homem- se
estavam namorando e ela respondeu que não sabia? Assumir
um simples namoro é difícil para
eles.
E tem mais: um pode achar que
a relação é estável e o outro não
-afinal, nada mais subjetivo do
que uma relação; mas agora, com
o tal do novo código, um deles pode ir à Justiça e, com duas testemunhas, pleitear a metade do
conjugado que o outro a duras
penas comprou, ou uma pensão.
Está certo? É claro que não. E isso
vai levar a quê? Os homens, que
odeiam compromissos, vão passar a evitar sair mais do que duas
vezes com a mesma mulher, para
que não seja caracterizada a tal
da relação estável.
Os mais ricos, coitadinhos,
esses nunca mais vão poder se
apaixonar.
Consequência imediata: nos almoços femininos de sábado, a reclamação sobre a falta de homem
vai aumentar. E o amor, que já
não era fácil de encontrar, vai ficar cada dia mais difícil.
As mais prósperas correm o
mesmo perigo. Se conseguiram
fazer uma poupança, por menor
que seja, não vão mais poder namorar o bonitão que mora com a
mãe, vive na praia e nunca pensou em trabalhar. A qualquer
momento ele vai ao juiz e leva a
metade -tem graça?
Os advogados acham que a solução é, logo no segundo encontro, tirar do bolso um documento,
a ser assinado pelos dois, segundo
o qual ambos renunciam a qualquer direito sobre os bens do outro -mais romântico, impossível. É, a vida sentimental da população vai sofrer um baque, e as
consequências das novas leis vão
repercutir na vida noturna, na
inspiração dos compositores, na
moda, nos salões de beleza, nos
hotéis dos balneários. Para que
comprar um vestido novo e sofrer
na ginástica, se não vai poder
mais namorar e cantarolar no
ouvido -ou ouvir- "Beija eu,
beija eu"? A vizinha de mesa poderá ser a testemunha que vai
acabar com a sua vida. E dormir
junto, bem enroscado, num fim
de semana, isso nunca mais.
Fora o direito de herança. Eu tenho uma amiga, casada há muitos anos, que tem três filhos de um
primeiro casamento, e ele, dois,
de outra mulher; o casal mora
num apartamento que é dela. No
dia em que o novo código foi divulgado na imprensa, minha
amiga leu tudo, atentamente, e
foi logo dizendo: "Se eu morrer,
você vai ficar com a metade do
meu apartamento, e quando você
morrer, seus filhos, que mal falam
comigo, vão herdar essa metade
de você; não é justo o que deveria
ser dos meus filhos ir para os seus,
e se um dia um deles tiver uma relação estável, quem vai se dar
bem será a namorada dele. Vou
ter que falar com um advogado;
afinal, tudo o que eu tenho é este
apartamento, e só eu sei o que ralei para comprar". Aí ele, irritado,
respondeu: "Você quer que eu faça o que, um testamento? Pelo visto, você não confia em mim; pois
fique sabendo que nem eu nem
meus filhos estamos interessados
na porcaria do seu apartamento".
O clima ficou ruim, ou melhor,
péssimo, e o domingo acabou
mal: desconfianças generalizadas, fim da paz familiar e, tudo
indica, o começo do fim do amor.
Esses juristas nem imaginam a
encrenca que arranjaram.
E-mail - danuza.leao@uol.com.br
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