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SAÚDE MENTAL
Internação continua prevalecendo em tratamento psiquiátrico
Manicômios resistem à legislação
AURELIANO BIANCARELLI
DA REPORTAGEM LOCAL
O Código de Saúde do Estado de
São Paulo prevê que as internações psiquiátricas serão usadas
como último recurso terapêutico
e que os manicômios deverão ser,
gradativamente, substituídos por
ações extra-hospitalares.
O código foi aprovado em 1995.
Seis anos depois, somente 500 pacientes estão sendo atendidos nas
120 casas terapêuticas do Estado.
Mais de 9.000 continuam em hospitais psiquiátricos.
Ontem, entidades que pregam o
fim dos manicômios comemoraram mais um Dia Nacional da Luta Antimanicomial. Hoje à noite,
uma festa no "casarão da rua Itapeva", onde funciona o Centro de
Apoio Psicossocial (considerado
o Caps pioneiro), vai marcar a data com apresentações e forró.
O "casarão" foi enfeitado com
bandeirolas que comemoram a
sanção da lei federal que determinaria o fim do manicômio.
Mas a lei não determina o fim de
nada. Originalmente proposta
pelo deputado Paulo Delgado
(PT-MG), em nome do Movimento pela Luta Antimanicomial,
a lei sancionada no dia 6 de abril
permaneceu uma década no Congresso sem mudar o cenário da
saúde mental no país.
O que pretendia ser a decretação do fim do manicômio transformou-se numa proposta de
conduta que enfatiza os direitos
humanos. "A lei aponta na direção que buscamos, mas saiu bastante descarnada", diz Marcus Vinícius de Oliveira, do Conselho
Federal de Psicologia e membro
da comissão de saúde mental no
Conselho Nacional de Saúde.
Enquanto a lei patinava no Congresso, pelo menos seis Estados
aprovaram legislações que apontam para a substituição dos manicômios. "Na prática, pouca coisa
mudou", diz o deputado Roberto
Gouveia (PT), autor da lei do Código de Saúde paulista.
Em meados dos anos 80, 97%
dos gastos gerais com saúde mental eram consumidos com internações psiquiátricas e o restante
com serviços alternativos. Hoje, a
proporção é de 95% para 5%.
"Há um consenso entre governos, profissionais e mesmo usuários de que a grande maioria dos
pacientes poderia estar em serviços comunitários, mas continua
ocorrendo o contrário", diz a psiquiatra Ana Pitta, coordenadora
do programa estadual de saúde
mental e que comandou até agosto a área no Ministério da Saúde.
Segundo ela, pelo menos 60 mil
pacientes poderiam estar sendo
acompanhados em rede ambulatorial, mas o número de serviços é
de apenas 232. "São R$ 432 milhões anuais gastos com internações e apenas R$ 22 investidos em
serviços comunitários."
Para psiquiatras que defendem
a reforma, como Jonas Melman,
do Caps-Itapeva, a resistência às
mudanças decorrem da pressão
dos donos de hospitais psiquiátricos e da preocupação da sociedade, que teme ver seus "loucos" fora dos manicômios. No debate, a
polêmica se concentrou em
"manter ou fechar hospitais e leitos psiquiátricos", quando o problema é mais amplo.
Casa terapêutica
Entre os argumentos daqueles
que criticam a "luta antimanicomial" estão a necessidade da manutenção de modernos serviços
psiquiátricos e os custos dos equipamentos alternativos. Para o
professor Valentim Gentil Filho,
titular de psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP, o país vive um "problema crônico de desassistência", com metade dos
moradores de rua sofrendo de
problemas psiquiátricos graves.
"Sou contra os manicômios,
mas precisamos de hospitais modernos e de casas asilares que possam abrigar as pessoas. Casas terapêuticas, para oito pessoas, são
caras, uma ficção."
Pelos cálculos das entidades que
adotaram essa prática, os custos
das casas assistidas são menores
que os R$ 700 mensais pagos pelo
SUS aos hospitais psiquiátricos.
No Rio Grande do Sul, a legislação vem mostrando que pode haver consenso entre as partes. A lei
do deputado Marcos Rolim (PT),
aprovada em 92, desistiu de fixar
prazos para fechamento dos manicômios e priorizou serviços alternativos. Hoje, dois terços dos
500 municípios do Estado têm
serviço psiquiátrico comunitário.
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