São Paulo, Quarta-feira, 19 de Maio de 1999
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SAÚDE
Medida é consequência da lei das entidades filantrópicas, que acaba com a isenção da contribuição previdenciária
Hospital do Coração reduz atendimento

PRISCILA LAMBERT
da Reportagem Local

O Hospital do Coração, em São Paulo, anunciou ontem que terá de reduzir em pelo menos 60% os recursos destinados ao atendimento de crianças carentes com problemas cardíacos.
Em menos de uma semana, esse é o segundo hospital que atende casos de alta complexidade em São Paulo a anunciar redução do atendimento gratuito em consequência da nova lei que afeta as entidades filantrópicas.
Na área da saúde, a lei acaba com a isenção da contribuição previdenciária em hospitais filantrópicos que não atendem pacientes do SUS (Sistema Único de Saúde).
Na última sexta-feira, a Folha informou que, por consequência dessa lei, o hospital Albert Einstein decidiu reduzir 40% dos seus recursos destinados ao atendimento a carentes -acabando com cirurgias complexas, como transplantes de órgãos e cirurgias cardíacas.
No Hospital do Coração, ficará prejudicado o atendimento a crianças carentes. Hoje, são feitas 25 cirurgias cardíacas por mês em crianças, cada uma com custo de R$ 30 mil, segundo o hospital.
Procedimentos que poucos hospitais realizam, como cirurgias cardíacas em neonatos (crianças com até um mês de vida), também devem ser reduzidas no Hospital do Coração. O investimento com o serviço gratuito, que foi de R$ 10,1 milhões em 98, não deverá ultrapassar os R$ 4 milhões neste ano.
Agora, com o fim da isenção, devem ser recolhidos R$ 8 milhões anuais relativos à cota patronal da instituição. Pela lei antiga, o hospital tinha isenção total da contribuição previdenciária porque, além de preencher os requisitos legais (veja quadro ao lado), destinava mais de 20% de sua receita bruta à filantropia -outro requisito que perdeu o valor com a nova lei.
Dos R$ 44,4 milhões de receita bruta que o hospital arrecadou em 98, quase 23% foram para os serviços de diagnóstico, pronto-socorro e cirurgias de carentes.
Segundo Ieda Jatene, chefe da pediatria do hospital, os reflexos dessa lei são muito negativos. "As equipes médicas hoje fazem esses procedimentos gratuitamente porque o hospital arca com material e toda a estrutura necessária. Quando isso acabar, também não poderemos mais continuar."

Confusão
A Associação Congregação de Santa Catarina, mantenedora do Hospital Santa Catarina, em São Paulo, também informou que está estudando cortes.
A associação, que mantém também creches e outros hospitais no país, oferece, no total, 55% de leitos para o SUS. A instituição terá de arrecadar parte de sua cota patronal, já que, pela nova lei, os hospitais que atenderem menos de 60% de SUS terão uma isenção proporcional ao atendimento.
Mas muitos dirigentes de entidades ainda não sabem que a lei está em vigor desde abril ou têm dúvidas sobre seu conteúdo.
"Se essa lei passar a valer, vamos ter de reduzir muitos serviços, fechar creches e acabar até com uma das casas que cuida de portadores de HIV no Ceará", disse o diretor financeiro da mantenedora do Santa Catarina, Dorival Rodrigues Silva, que não sabia que terá isenção parcial de acordo com a lei.
O ministro José Serra (Saúde) lamentou, na semana passada, a criação dessa lei. Ele estima que o sistema de saúde irá perder até R$ 300 milhões, principalmente nos serviços de alta complexidade -já que os hospitais que oferecem serviços mais complexos são os mais atingidos pela lei.
Segundo o Ministério da Previdência e Assistência Social, a lei terá como função impedir casos de desvio de dinheiro por entidades "ditas filantrópicas" (leia abaixo).


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