São Paulo, domingo, 19 de julho de 1998

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DROGAS
Relatório confidencial entregue a FHC revela presença de crime organizado e armas modernas no Polígono da Maconha
Governo teme roças de coca no sertão

WILLIAM FRANÇA
da Sucursal de Brasília

O governo federal perdeu o controle policial e social da região do sertão pernambucano conhecida como polígono da maconha e teme que ela acabe atraindo máfias internacionais de narcotraficantes. O maior dos temores: que a maconha seja substituída nas plantações pela coca, para a produção de cocaína, ou pela papoula, matéria-prima da heroína.
A aliança entre os plantadores de maconha e o crime organizado da região Sul/Sudeste já existe.
Relatório produzido no final do ano passado pela Subsecretaria de Inteligência da Casa Militar da Presidência, ao qual a Folha teve acesso, diz que foi detectada a "presença de elementos oriundos do Sudeste do país que fornecem armas modernas de grosso calibre na troca por maconha".
O relatório, classificado como "confidencial" e repassado ao presidente Fernando Henrique Cardoso, traz uma revelação surpreendente: que as quadrilhas que agem no assalto a bancos, carros-fortes, caminhões de carga e estabelecimentos comerciais "têm duas metralhadoras ponto 50 montadas em duas camionetes", numa demonstração do poderio bélico que possuem.
Essa aliança entre produtores de maconha e o crime organizado, diz o relatório, elevou os crimes a um estágio de "violência avassaladora". Os investigadores que percorreram a região citam como exemplo o assalto à agência do Banco do Brasil de Inajá (PE), em 26 de novembro do ano passado. O assalto terminou com um saldo de sete mortos e cinco feridos.
"É essa falta de controle que pode ser um passo para, além da maconha, haver o plantio da coca e da papoula, pois a área tem clima e solo ideais para essas produções", disse à Folha o secretário nacional Antidrogas, Walter Maierovitch, que assume o cargo em outubro.
Delegacias sem delegados
A pressão para que os agricultores nordestinos não plantem apenas maconha pode crescer na medida em que governos, como o da Colômbia, vêm intensificando campanhas de incentivo aos plantadores para trocarem a coca pela produção de café.
Ao listar as causas que contribuíram para a transformação da região, o relatório é claro e exemplifica: o descumprimento de compromissos assumidos por parte da Chesf (Companhia Hidrelétrica do São Francisco), no reassentamento de famílias retiradas de áreas inundadas por barragens nos anos 80, resultou no incremento do plantio da maconha.
Outra causa é o lucro rápido. Enquanto um hectare de feijão produz 2 toneladas (rendendo cerca de R$ 1.200), o mesmo terreno plantado com maconha rende 3,6 toneladas (cerca de R$ 90 mil) -um lucro 75 vezes maior.
O trabalhador rural, em uma roça comum, ganha cerca de R$ 5 por dia. No plantio de maconha, a remuneração diária chega a R$ 50. Isso justifica o alto padrão de vida de algumas famílias de agricultores da região, incompatível com a pobreza generalizada.




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