São Paulo, sábado, 19 de novembro de 2005

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RETRATOS DO PAÍS

Segundo estudo de programa da ONU, se os brancos formassem uma nação à parte, posição seria a 44ª

Brasil dos negros é o 105º de ranking social

FÁBIO TAKAHASHI
DA REPORTAGEM LOCAL

Um estudo divulgado ontem pelo Pnud (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) mostra que, se os negros brasileiros formassem um país, ele ocuparia a 105ª posição no ranking que mede o desenvolvimento social no mundo, enquanto o Brasil "branco" seria o 44º.
A publicação, chamada de "Relatório de Desenvolvimento Humano Brasil 2005 - Racismo, Pobreza e Violência", foi lançada em São Paulo. Ela envolve a análise de dados relacionados a desenvolvimento humano, educação, saúde, violência e habitação.
Devido às desigualdades no país apontadas na pesquisa, o órgão da ONU (Organização das Nações Unidas) disse que a democracia racial no Brasil é um "mito".
Segundo o último censo do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), feito em 2000, 44,7% da população brasileira se autodeclarou negra ou parda.
Uma das tabulações presentes no relatório analisa o IDH de 2002, índice feito pelo próprio Pnud que mede o desenvolvimento humano dos países, considerando a expectativa de vida, a alfabetização e o PIB (Produto Interno Bruto) per capita.
Se brancos e negros do Brasil formassem países separados, seriam 61 posições de diferença. O ranking liderado pela Noruega tem 173 países. O Brasil "unificado" fica em 73º. O Uruguai é o 40º, o México 54º e a Argentina, 34ª.
As diferenças também aparecem dentro do país. A faixa mais bem posicionada no IDH seria a de brancos do Distrito Federal, 33º lugar, semelhante ao da República Tcheca, onde o PIB per capita anual era de US$ 14 mil -em valor atual, R$ 31.200.
Por outro lado, os negros de Alagoas ficariam em 122º lugar, com a Namíbia, cujo PIB per capita era de US$ 6.500 (R$ 14.500).
"Isso mostra a diferença de bem-estar que há no país. Temos o Leste Europeu e a África", afirmou José Carlos Libânio, membro do Pnud e um dos principais colaboradores do relatório.
Neste ano, os dados relacionados ao IDH foram atualizados, mas não foi possível usá-los -o relatório divulgado ontem demorou dois anos para ser concluído.

Mito
O estudo analisou também índices sobre itens como saúde e educação. "Em todos os dados vemos que a população negra está mal", disse Diva Moreira, editora do relatório. "Não vamos superar a pobreza e a violência do país sem enfrentar o racismo presente na estrutura da sociedade brasileira."
Foram essas constatações que levaram o Pnud a afirmar no relatório que a democracia racial brasileira é um "mito".
Alguns exemplos apontados no relatório: 2,5% dos negros estão no ensino superior, ante 11,7% dos brancos; a mortalidade infantil, em cada mil nascidos vivos, é de 30,75 entre os negros e de 22,93 entre os brancos.
O relatório aponta ainda que a porcentagem de homens negros com curso superior completo em 2000 era menor do que a dos homens brancos em 1960. Já a esperança de vida dos negros, também em 2000, era semelhante à dos brancos em 1991.
Isso, de acordo com o estudo, mostra que a população negra está com uma geração de atraso em algumas questões sociais.
A pesquisa apontou também problemas no mercado de trabalho. Entre as 500 maiores empresas do país, 23,4% dos profissionais nos cargos mais baixos são negros. Já nos postos mais altos, de executivos, o índice cai para 1,8%. Os dados são do Instituto Ethos, pesquisados em 2003.
Para diminuir essa diferença, o relatório afirma que são necessárias, além de políticas universalistas, medidas pontuais, como as cotas de vagas -tanto no ensino superior quanto nos empregos dos serviços públicos.
"Essas medidas devem ser temporárias, mas têm de ser tomadas. Se mantiver a velocidade do que está hoje, demorará 500 anos para haver um equilíbrio", afirmou Libânio. "Para atingir a igualdade, é preciso tratar desigualmente quem está em situação desigual."


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