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PASQUALE CIPRO NETO
Você é presbita?
O presidente eleito está no centro das atenções.
Até seus óculos vão para a primeira página dos jornais. Nesta
semana, falou-se do mal que aflige os olhos de Sua Excelência (e os
de quem superou a barreira dos
40 janeiros): a presbiopia.
Esse termo grego, em que está
presente o elemento "presbi(o)-"
("velho", "ancião"), é definido assim pelo "Aurélio": "Distúrbio visual que se observa na velhice, e
em que se perde, por baixa da
elasticidade e por diminuição da
capacidade de acomodação do
cristalino, o poder de distinguir,
com nitidez, objetos próximos".
Em "presbiopia", além de "presbi(o)-", temos "-opia", que significa "visão". Literalmente, "presbiopia" significa "visão de velho".
Pois bem, como os oftalmologistas dizem que a presbiopia ataca
"um belo dia, depois dos 40", conclui-se, a partir disso e do que
afirma o "Aurélio", que a velhice
chega mesmo aos 40. Já podemos,
caro Lula, ostentar o título que
Caetano Veloso nos dá na primorosa "O Homem Velho": "O homem velho é o rei dos animais".
E quem sofre de "presbiopia" é o
quê? Recentemente, numa publicidade exibida num site, fazia-se
esta pergunta: "Você é présbita?".
Os dicionários e o "Vocabulário
Ortográfico" não registram "présbita"; só registram "presbita" (paroxítona; lê-se "presbíta").
Moral da história: o presidente
eleito é presbita. Isso me lembra
um fato que ocorreu comigo numa aula de acentuação. Num dos
exercícios, havia a palavra "pudico". Não há acento nessa palavra,
caro leitor, portanto não se lê "púdico"; lê-se "pudíco". Perguntei a
uma aluna se ela era pudica. "Sai
pra lá", disse ela, imaginando que
a tal palavra fosse desabonadora.
Tergiversei para ver se conseguia me livrar da necessidade de
explicar o significado de "pudica", o que equivaleria a expor a
moça a constrangimentos. Não
houve jeito. Em coro, os alunos
pediram o significado, que é este:
"Que tem ou revela pudor; casto,
recatado; que se envergonha".
Quem lê "púdico" comete silabada ("erro de pronúncia, especialmente o que consiste em deslocar o acento tônico da palavra"). Vale a pena aproveitar a
ocasião para citar outras palavras que costumam deixar em
dúvida os falantes: "ibero", "rubrica", "condor", "gratuito", "circuito", "outrem" etc.
Como você as leu? Basta observar a grafia. Lê-se "ibéro" (e não
"íbero"). Se a palavra fosse proparoxítona, haveria acento no "i".
Vejamos a pronúncia considerada culta das demais: "rubríca" (e
não "rúbrica"), "condôr" (e não
"côndor"), "gratúito" (e não "gratuíto"), "circúito" etc. A sílaba tônica de "outrem" é a primeira,
portanto não se lê "outrém".
Neste texto, falei de "óculos"
("Até seus óculos vão..."). Pois
bem, "óculos" é o plural de "óculo". Veja este fragmento do pungente poema "Elegia na Morte de
Clodoaldo Pereira da Silva Moraes, Poeta e Cidadão", de Vinicius de Moraes: "Dize-me, meu
pai / Que viste tantos anos através
do teu óculo-de-alcance / Que
nunca revelaste a ninguém?".
"Eu uso óculos escuros", diz J.
Mautner na antológica "Vampiro"; "Quem não tem colírio usa
óculos escuros", diz a canção de
R. Seixas e P. Coelho. Que os novos óculos o ajudem a enxergar
bem, caro presidente. É isso.
Pasquale Cipro Neto escreve nesta coluna às quintas-feiras.
E-mail - inculta@uol.com.br
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