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COLAPSO NA SEGURANÇA
Misael Silva foi linchado ontem por cinco detentos; ordem teria vindo de outros líderes da facção, descontentes com suas decisões
PCC mata Misa, um de seus fundadores
SÍLVIA CORRÊA
DA REPORTAGEM LOCAL
ALESSANDRA KORMANN
DA AGÊNCIA FOLHA
A facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital) matou ontem um de seus fundadores
e principais líderes -Misael Aparecido da Silva, 41, o Misa. A autoria do crime foi confirmada por
um porta-voz da facção e pelo governo de São Paulo, segundo o
qual os autores do assassinato são
mesmo integrantes do PCC.
É o segundo fundador da organização morto por seus membros
nos últimos meses. Em julho, eles
mataram Idemir Carlos Ambrósio, 41, o Sombra, um dos criadores do "partido do crime" e mentor da maior rebelião em cadeias
do país, ocorrida há um ano em
29 cadeias de São Paulo.
Misa não foi ativo na megarrebelião paulista. Na ocasião, estava
em Piraquara (PR), onde quatro
meses depois integraria o comando do maior motim da história do
sistema local, que terminou após
143 horas e quatro mortos.
Em seguida, foi para São Paulo.
Em 21 de dezembro, para a Penitenciária Maurício Henrique Guimarães Ferreira, a P-2 de Presidente Venceslau (620 km de SP),
onde foi assassinado ontem.
A morte de Misa é a 18ª registrada em menos de 72 horas em dez
penitenciárias do Estado. Pelo
menos 13 dessas mortes foram resultado de disputas internas do
PCC ou de confrontos de membros da facção com rivais.
Pego de surpresa
Misa foi morto às 8h25, durante
o banho de sol, no pátio da penitenciária. Cinco presos aproximaram-se dele pelas costas, passaram um cordão pelo seu pescoço
e o derrubaram no chão.
Em seguida, bateram em sua cabeça repetidas vezes com um rodo até matá-lo por traumatismo
craniano e estrangulamento.
Apenas um dos integrantes do
grupo, Ricardo Alexandre Lúcio,
assumiu o crime. Ele e os outros
quatro presos -José Fernandes
Ferreira, Fábio Ricardo Querino,
Arilson Silva Souza e Robson Luiz
Gonçalves- foram isolados dos
demais. A ação dos quatro teria sido vista por agentes carcerários.
Segundo o diretor da penitenciária, Osny Carlos Screpanti, um
inquérito e uma sindicância administrativa foram abertos para
apurar o crime. Ele afirma que os
funcionários que presenciaram a
cena nada puderam fazer "porque eram três contra 125 presos".
A P-2 de Presidente Venceslau,
cuja última rebelião ocorreu em
1999, é uma das unidades que menos têm membros do PCC no Estado de São Paulo. Na megarrebelião ela não se juntou às quase três
dezenas de cadeias rebeldes.
Ordem de cima
A morte de Misa, de acordo com
um porta-voz do PCC -solto e
que pediu para não ser identificado- foi determinada por seus
pares: outros fundadores da facção. A ordem teria sido dada há
cerca de 15 dias a partir do Rio de
Janeiro, onde estão detidos José
Márcio Felício, o Geleião, e César
Augusto Roris da Silva, o Cesinha.
Só não teria sido executada antes porque Misa estava em RDD
(Regime Disciplinar Diferenciado) -isolado-, o que é confirmado pelo governo.
Com a determinação, sempre
de acordo com o porta-voz do
PCC, teriam concordado outros
dois presos que estão ganhando
força na facção: José Eduardo
Moura da Silva, o Bandejão (preso em Mato Grosso do Sul), e Júlio
César Guedes Moraes, o Julinho
(preso na Bahia). O motivo: disputa por poder na organização.
Cálculos de advogados do PCC
indicam que Geleião tem cerca de
30 mil comandados diretos
-dentro e fora das cadeias. Cesinha e Misa, outros 20 mil cada.
Misa e seus homens estariam fazendo ações à revelia dos demais
líderes e de seus grupos. O porta-voz não disse que ações seriam.
Disputa ou desordem
A informação do porta-voz do
PCC encontra amparo no estatuto da facção criminosa e na opinião de algumas autoridades.
Pelo estatuto do PCC, traição de
poder e dinheiro podem ser punidas com morte. "E ela só pode ser
decretada pelos fundadores e alguns poucos líderes", confirmou
Anselmo Neves Maia, um dos advogados dos acusados e da vítima.
"Para mandar matar o Misa,
tem de ser "general", tem de ter
condições morais e aval dos demais. A morte não é liberada como se imagina. É sempre muito
discutida, avaliada", continuou,
afirmando que procurará os líderes da facção para saber exatamente o que aconteceu.
Uma disputa por poder. É também no que acredita o promotor
de execuções penais Mário Coimbra, do Ministério Público de Presidente Prudente, que deve ir hoje
à cidade. "Desconfio que tenha sido briga por liderança dentro da
organização, em decorrência das
mortes de ontem [anteontem"."
Mas o também promotor Roberto Porto, que investiga a facção
na capital, levanta mais uma hipótese. "Pode ser disputa e acerto
de contas, mas pode também ser
descontrole. Os fundadores podem estar perdendo espaço para
outras lideranças."
Colaborou o "Agora"
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