São Paulo, sábado, 20 de março de 2010

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ANÁLISE

Bons resultados não se devem só à escola

SILVIA COLELLO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Avaliar escolas é uma tarefa complexa. Isso porque o impacto da escolaridade sobre o estudante vai além da esfera cognitiva. Tem implicações ao longo da vida: sua visão de mundo, modo de inserção social, raciocínio crítico, habilidade de organização e planejamento, criatividade, liderança, postura ética, senso de responsabilidade e compromisso social, entre outros aspectos.
Na amplitude do processo educativo, parece difícil apreender tantas metas desejáveis na formação humana. Por isso, a precariedade da cultura avaliativa no Brasil muitas vezes se reduz à publicação de um ranking de escolas, elaborado com base em uma única prova (como é o caso do Enem), cujos critérios nem sempre são evidentes para a população.
Assim, os valores educativos se submetem aos números e acirram a dimensão empresarial das escolas. As avaliações traduzidas pelo ranking acabam servindo como recursos mercadológicos que definem o fluxo na busca de escolas.
Nesse contexto, a pesquisa Eduqual com ex-alunos de 11 colégios em SP configura-se como iniciativa relevante porque, ao incorporar critérios nunca antes considerados, acaba por agregar dados, ampliar a visibilidade sobre o conjunto do esforço educativo e sofisticar os mecanismos de avaliação.
A despeito dos méritos, há duas ressalvas. Os bons resultados dos alunos não se devem só à ação escolar mas também ao perfil da clientela. Os estudantes de escolas particulares são aqueles que têm maior acesso à cultura letrada, mais experiências extraescolares, melhores condições de frequentar as universidades e chances de chegar ao mercado. É preciso admitir: as boas escolas são boas também porque lidam com um público com mais probabilidade de se inserir produtivamente.
A respeito do uso institucional da avaliação, é preciso ter cautela com a eventual manipulação: com mais dados à disposição, o arranjo na mostra e omissão de resultados pode se constituir como um instrumento a serviço do mercado escolar, perpetuando os vícios das práticas avaliativas.
Outra vez, o senso crítico e o compromisso com a educação nos levam a questionar: avaliar a educação, como e para quê?


SILVIA COLELLO é professora da Faculdade de Educação da USP


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