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OPINIÃO
Monólogo a dois
JACOB PINHEIRO GOLDBERG
Quem matou Jesus? Quem matou 6 milhões de judeus? O aparente diálogo que se estabeleceu
após a tragédia da "shoah" (e não
Holocausto), na Segunda Guerra
Mundial, entre a igreja e a sinagoga nunca atingiu a autenticidade e
a coerência indispensáveis.
Medo, culpa, sentimentos recalcados de amor e ódio se embaraçam numa teia complexa, em que
a franqueza não encontra lugar.
Alguns pontos demandam mais a
reflexão teológica e psicológica do
que o "modus vivendi" político.
É preciso mergulhar na origem
das contradições e do afastamento, até as teratológicas implicações. De um lado, a saga de Jesus,
Yeoshua Ben Yossef -um camponês judeu do Mediterrâneo, na
definição de John Dominic Crossan-, relatada numa linguagem
epopéica e passional pelos apóstolos, companheiros judeus.
A mensagem, renovada e transmitida pela ambiguidade do gênio
político de Saulo de Tarso, que
conquista o imaginário e o simbólico como Paulo, culmina na conquista do império que se afirma
em Roma. "Meu Deus, meu Deus,
por que me abandonaste?" - as
palavras na cruz (suplício do dominador romano) invocam o
enigma: José, a identidade paterna, o abandono diante da repressão, a humilhação imposta.
Ou se faz a inserção (que nem
cristãos nem judeus admitem) de
Jesus no cenáculo existencial de
sua história ou a "judeufobia" do
deicídio evolui, independente de
declarações ou "mea culpa".
O papa Pio 12 foi omisso diante
do crime nazista, como Hochnut
denuncia em "O Vigário"? Sim.
Mas não foi pessoal sua atitude.
Decorreu de dois milênios de síndrome de Caim (segundo o psicanalista Szondi). A escola de Pilatos
se reproduz. Khalil Gibran escreveu sobre a necessária reconciliação entre Cristo e Jesus. Joseph
Klausner, da Universidade Hebraica, afirmou que Jesus foi o
mais apaixonado autor das parábolas mais sublimes do judaísmo.
A transformação do martírio de
Jesus, por parte de Roma, na justificação do anti-semitismo só pode
ser compreendida numa releitura
horizontal dos quatro Evangelhos,
à luz dos manuscritos do mar
Morto, constatando discrepâncias
e não aparentes convergências.
Que o ovo da serpente tenha germinado na Alemanha cristã foi reportado por Gallagher. O sacrifício de Abel não demanda desculpas. Tudo foi imperdoável.
Só a graça divina e a inteligência
antropológica podem prometer
um silencioso reencontro de irmãos, sobre a dor cósmica. Diante
de Auschwitz e do Calvário, a introspecção convida a que os companheiros de ascese implorem a
redenção. Nem monólogo nem
diálogo. A prece.
Jacob Pinheiro Goldberg, 64, advogado e assistente social, é doutor em psicologia pela Universidade Mackenzie e autor de "Historic Invention and Psychological Understanding of Jesus"
(1978). E-mail: goldberg@uol.com.br
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