São Paulo, domingo, 20 de abril de 1997.

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CRISES HUMANAS
Psicoterapias breves que duram de 3 meses a 1 ano auxiliam pessoas a enfrentar morte de parentes
Serviços ajudam superar dor do luto

Niels Andreas/Folha Imagem
Decorador Paulo Sérgio Souza, que fez uma colcha para homenagear o companheiro que morreu de Aids


da Reportagem Local

O luto pela perda de alguém talvez seja a mais íntima e sofrida das dores. É também a mais comum e a menos reconhecida delas. De todas as crises que povoam a vida das pessoas, a morte de alguém querido é a que demanda mais tempo e energia para ser aceita.
Por tudo isso, o luto é também a crise que mais deixa sequelas. Para compreender esse momento e ajudar pessoas que estão passando por ele, a PUC (Pontifícia Universidade Católica) de São Paulo criou o Lelu, Laboratório de Estudos e Intervenção sobre o Luto.
O serviço faz parte do Programa de Estudos de pós-graduação em Psicologia Clínica da universidade. Uma dúzia de profissionais se dedica ao programa, que tem o apoio da Fapesp, Fundo de Apoio à Pesquisa do Estado de São Paulo.
Em outra frente, o Grupo Pela Vidda -que trabalha com pessoas com a Aids- está ``enfrentando'' a morte com colchas coloridas.
Usando retalhos de tecidos, parentes e amigos homenageiam os mortos com temas que marcaram suas vidas (leia texto na pág. 7).

Mortos no shopping
O Lelu tem três frentes de trabalho. Uma delas é o atendimento clínico oferecido aos pacientes enlutados. São psicoterapias breves que duram de três meses a um ano.
Entre os atendidos estão pessoas que perderam familiares na explosão do shopping de Osasco e na queda do avião da Tam. Há mulheres que sofreram aborto, mães que perderam filho ou crianças que ficaram sem o pai ou a mãe.
Outra frente é a preparação de profissionais que se defrontam com a morte com mais frequência. O terceiro trabalho é de pesquisa: entender como as pessoas reagem nas situações de perda.
Uma das constatações é que as pessoas não estão tendo nem se dando o direito de enlutar-se. ``O luto lembra a morte, e as pessoas lidam mal com a morte'', diz Maria Helena Bromberg, psicoterapeuta e coordenadora do Lelu.
Num final de século onde tudo é previsível, onde o homem controla a máquina e a natureza, a morte parece um acontecimento fora de lugar, diz a coordenadora do Lelu.
No entanto, 180 pessoas morrem por dia na cidade de São Paulo. Foram 65 mil mortes no ano passado, segundo a prefeitura. Somados os familiares e amigos, 1 milhão de pessoas vivem o luto por ano.
A profundidade da dor de cada um depende do grau dessa perda, diz Maria Helena. A mais difícil de ser elaborada é a de um filho.
``Porque o normal é que os pais sejam enterrados pelos filhos, e não o contrário'', diz. A maioria dessas mortes ocorre de forma violenta e inesperada, o que aumenta mais a dor da perda.
Só em São Paulo ocorrem cerca de 25 mortes violentas por dia. Treze pessoas são assassinadas a cada 24 horas, cinco morrem no trânsito. No ano passado, 506 pessoas se mataram na cidade. O suicídio de um filho é considerado uma dor inconsolável.
Os pesquisadores dizem que a morte de alguém próximo marca tanto que a pessoa não será mais a mesma. ``O luto é uma transição psicossocial'', diz Maria Helena.
``Se bem elaborado, o luto será positivo para o desenvolvimento pessoal. A viúva que ficou só, tendo que administrar a casa e os filhos, vive uma fase dolorosa. Mas, enfrentando isso, ela vai crescer.''
Um dos grupos do Lelu é voltado para casais que querem adotar um filho porque perderam um, por causa de um aborto ou por problemas de fertilidade. ``A terapia pode ajudar a tornar mais saudável a substituição de um filho por um outro'', diz Gabriela Casellato, psicoterapeuta do grupo.


Informações sobre o Lelu, tel. (011) 3794-4647
AURELIANO BIANCARELLI

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