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São Paulo, domingo, 20 de julho de 2003

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MULHERES NO PODER

Mulheres acima de tudo

DA REPORTAGEM LOCAL

Nem a sisudez de um comando linha-dura, nem a fragilidade de uma chefia mais permissiva. Todas as quatro tenentes-coronéis que comandam batalhões de área em São Paulo se definem como moderadas.
"Justa. Não há outra palavra", afirma a tenente-coronel Virginia Maria Vilani Malone Ortega, 39, comandante do 34º BPM.
"Os dois extremos são condenáveis", completa a tenente-coronel Ângela Di Márzio Godoy Vasconcelos, 40, do 13º BPM.
"Procuro ser clara no que quero, para que ninguém aja e depois venha me dizer que não sabia", diz a tenente-coronel Marly Moreno, 42, do 23º BPM.
"Precisamos seguir a legislação e o regulamento acima de tudo", afirma a tenente-coronel Fátima Ramos Dutra, do 30º BPM.
As quatro entraram na polícia como soldados e, por meio de concursos, chegaram ao penúltimo posto da carreira, diferentemente de parte dos oficiais homens, que já começam na profissão como tenentes -o primeiro posto dos que são formados na Academia do Barro Branco.
Do quarteto de "coronéis de saias", duas são casadas com PMs -um deles de patente inferior, capitão- e três optaram por não ter filhos por questões pessoais e profissionais -passam mais tempo no quartel do que em casa.
Na profissão, dizem nunca ter sofrido discriminação. E aonde pretendem chegar? Aonde for possível. Se uma vaga de coronel fosse aberta hoje, duas delas poderiam ocupá-la: Fátima e Marly, por já terem completado o curso superior de polícia, obrigatório para a promoção.
Todas são vaidosas. Usam cabelos curtos, batom e brincos. Para as fotos da Folha, preferiram posar com uniforme operacional -o usado na rua-, com arma na cintura, atentas a todos os detalhes do equipamento e a gestos.

Perfis
O pai da então bancária Marly Moreno achava que polícia não era coisa para mulheres até vê-la fardada, aos 19 anos, na escola de soldados. "Meu pai passou a andar com uma foto minha fardada na carteira, e mostrava para todo mundo", conta a tenente-coronel.
Na PM, estudou direito e educação física. Seu batalhão, no mês passado, prendeu um homem acusado de atacar mulheres na saída de shoppings da capital.
A tenente-coronel Virginia Ortega é a única que teve filhos. O marido é capitão. Quando se conheceram, ele era sargento e ela cabo -abaixo dele na hierarquia. "Falo que ele investiu bem", diz.
Bem-humorada, prestou concurso por causa de uma amiga, que hoje é capitão da PM. Antes de assumir o 34º BPM, a coronel estava na assessoria militar da Prefeitura de São Paulo, com a prefeita Marta Suplicy.
A tenente-coronel Fátima é a única filha de PM. "Achava linda a farda dele", conta. O pai se aposentou como segundo tenente. A mais nova de quatro filhos, a coronel tem uma irmã PM, que hoje é sargento. Católica, Fátima prefere ficar em casa a sair à noite. Gosta de livros de auto-ajuda. O marido acabou de ser promovido a tenente-coronel. Quando se conheceram, os dois eram capitães.
A tenente-coronel Ângela, evangélica, é a mais religiosa. O marido, professor de educação física, virou pastor depois de se recuperar de um câncer.
Filha de imigrantes -três dos seus seis irmãos nasceram na Itália-, Ângela afirma ter entrado na profissão por causa da estabilidade. Era secretária na época.
Em 84, quando ainda era soldado, um homem de 30 anos, sob efeito de drogas, tentou agredi-la dentro da catedral da Sé. Sem arma ou cassetete, pois as policiais não usavam, os dois rolaram por quase dez minutos no chão, "na frente de homens que não se sensibilizaram em ajudar", recorda. Com um golpe que aprendeu na escola, ela derrubou o agressor e o imobilizou, depois de levar uma mordida no braço, cuja marca existe até hoje.
"Era uma questão de honra. Não podia deixá-lo fugir, até para poder ir trabalhar de novo."

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