São Paulo, domingo, 20 de agosto de 2000


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PATRIMÔNIO
Abandonada pelo poder público, região que foi frequentada por família imperial é devastada por ocupação desordenada
Sítio histórico do Rio é invadido por favelas

SERGIO TORRES
ENVIADO ESPECIAL A PETRÓPOLIS

Abandonado pelo poder público, o sítio histórico formado pela estrada do Imperador, pelo caminho do Ouro e pela secular ferrovia Raiz da Serra-Petrópolis, no Rio de Janeiro, foi invadido por favelas.
A ocupação desordenada do lugar, frequentado no século passado pela família imperial brasileira, provoca, além dos prejuízos à história do país, a devastação da floresta de mata atlântica característica da região, uma das mais belas da serra fluminense.
A estrada, o caminho e a ferrovia, já desativada, cortam a serra da Estrela, barreira natural entre os municípios de Magé (Baixada Fluminense, na periferia do Rio) e Petrópolis (a 65 km da capital, na região serrana).

Relíquias
A serra da Estrela guarda em suas matas relíquias históricas, como o caminho do Ouro (ou caminho dos Mineiros, como é chamado no lugar), rota de passagem dos escravos levados do Rio para Minas Gerais, e os pontilhões de pedra da via férrea, inaugurada em 1883.
A região era o trajeto obrigatório da família imperial no rumo de Petrópolis, onde costumava passar as férias de verão.
De carruagem ou trem, o imperador d. Pedro 2º subia a serra da Estrela, acompanhado dos parentes, para descansar no palácio petropolitano.
Hoje, o panorama visto pelo imperador está desfigurado. Nos últimos dois anos, o traçado de 17 km da estrada do Imperador (o nome oficial, estrada Velha da Estrela, é pouco usado) passou a se caracterizar pelas favelas que crescem nas duas margens.

História do país
Um crescimento desorganizado que enche encostas e vales de barracos e casebres, muitos deles construídos junto a marcos que contam um pouco da história imperial do país.
Um trecho do caminho do Ouro, por exemplo, está cercado pela favela recém-surgida na localidade de Lopes Trovão. Poucos ali sabem que aquele caminho de pedras tem quase 300 anos (foi aberto em 1723).
Da mesma forma, a favela batizada no mês passado de Vila União ocupa trechos da extinta linha férrea que ligava Raiz da Serra a Petrópolis.
A favela se alastra em torno da ferrovia, que já não tem mais os trilhos. Os novos moradores da área só sabem que antigamente trens passavam ali por causa das pontes de pedra, cujas estruturas em arco ainda se destacam sobre os abismos da serra.

15 favelas
Visita à região feita pela Folha na terça-feira mostra que há, pelo menos, 15 novas favelas crescendo nas margens da estradinha de paralelepípedos (quase uma favela por cada quilômetro entre Raiz da Serra e Petrópolis).
Para dentro da mata, contam os moradores, há mais barracos em construção, que ainda não são visíveis da estrada.
O secretário de Obras da Prefeitura de Petrópolis, José Roberto Machado da Costa, reconhece que, nos últimos anos, "houve um aumento muito grande" das invasões, mas que o processo de ocupação irregular teria começado há cerca de 40 anos.
À ocupação desordenada que degrada a natureza e destrói resquícios históricos se soma o trânsito de carros, ônibus e caminhões. Para fugir do pedágio (custa R$ 3,60) da rodovia Rio-Petrópolis, motoristas estão usando a estrada do Imperador como rota alternativa.
Atraídas pelos novos passageiros que habitam a serra da Estrela, empresas de ônibus aumentaram o número de linhas intermunicipais que passam pela estrada.
O resultado é visível: a pista está cheia de buracos, desnivelada e erodida nas laterais. Não há sinalização nem faixas de rolamento.
"Todo dia tem acidente. Até o ano passado eu poderia deitar na rua uma hora que não seria atropelado. Hoje, eu morreria na hora", disse o vendedor Francisco Cardoso, 25.


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