São Paulo, sexta-feira, 20 de agosto de 2004

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RETRATO DE SP

Em Moema, 3 de cada 4 nascimentos são cesáreas; para obstetra, "existe a percepção de que parto normal é de pobre"

Bairros ricos são campeões de cesarianas

DA REPORTAGEM LOCAL

Os bairros paulistanos onde as pessoas têm a melhor qualidade de vida da cidade são justamente os que concentram o maior percentual de partos por cesariana.
Em Moema (zona sul), o campeão do ranking, três em cada quatro partos são por cesárea (75%). No outro extremo, em Guaianazes, nos fundões da zona leste, é menos da metade disso (34%). Os dados são da Seade.
Líder, o bairro de Moema, que integra a Subprefeitura da Vila Mariana, foi também o campeão em ranking de IDH feito pela Prefeitura de São Paulo. A subprefeitura recordista é Pinheiros, onde 70,3% dos partos são cesáreas.
A disparidade que poderia ser outra desvantagem para os pobres não é necessariamente ruim. "Há a percepção, que está mudando, de que parto normal é coisa de pobre", diz o obstetra Abner Lobão Neto, da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo).
Segundo o médico, no parto normal a recuperação é mais rápida e o risco de futuros problemas, menor. "Quando você começa a forçar a barra em cima da natureza, ela cobra o preço." Ele diz, no entanto, que a cesariana é ótima, quando necessária.
Os motivos para o alto índice de cesarianas são muitos e vão desde arranjos para passar mais tempo perto do bebê à escolha do signo. Em alguns casos, os pais marcam o parto na sexta-feira, para que o pai possa ficar mais próximo.
Na semana passada, uma mulher antecipou em uma semana o nascimento do filho em uma das maiores maternidades de São Paulo para que não coincidisse com o aniversário do marido.
"É uma conjunção muito perversa. Tem a idéia de que parto normal é com dor ou altera a vagina. Além disso, existe a conveniência de, marcando o dia da cesariana, mãe e marido poderem acertar a agenda e aproveitar mais o momento", explica Lobão Neto, sobre o que motiva a elevada taxa de cesarianas na classe média alta.
Fora a conveniência do casal, o que conta muitas vezes é a facilidade para o médico. Eles recebem dos convênios quase o mesmo valor pelos dois tipos de parto, com a diferença de que o normal dura horas e horas, e a cesariana se resolve mais rapidamente.
Além de todos esses fatores, pode haver também a percepção de que o parto por cesárea é mais seguro. Grávida de seis meses e meio, a jornalista Katia Geiling, 29, ainda não decidiu, mas acha que seu parto será cesariana.
"Tenho medo de entrar em trabalho de parto e ficar pensando que está demorando demais, que o cordão umbilical está enrolado. Acho que na cesárea o médico tem mais controle." Mãe de um menino, ela ressalta que a idéia de cesariana não tem nada a ver com data marcada. (PEDRO DIAS LEITE)


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