São Paulo, domingo, 20 de agosto de 2006

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GUERRA URBANA

Eleição faz pessoas se mexerem, diz Saulo

Secretário da Segurança Pública afirma que integração entre forças de segurança federais e estaduais tem motivação política

Titular da pasta ressalta que o crime organizado é hoje o Bolsa-Família da favela e reclama por não ter sido ouvido pela sociedade civil

FABIO SCHIVARTCHE
DA REPORTAGEM LOCAL

A cooperação entre as forças de segurança federais e estaduais para combater o crime organizado em São Paulo tem uma motivação política: a proximidade das eleições. A análise é do secretário estadual da Segurança Pública, Saulo de Castro Abreu Filho, justamente um dos responsáveis por liderar a reação das autoridades paulistas ao PCC. "É a vantagem da crise. Em época de eleição, as pessoas se mexem", disse Saulo, 45, em entrevista exclusiva à Folha, na tarde de sexta-feira. O secretário é filiado ao PSDB e não excluiu das críticas a administração de seu chefe, o governador de São Paulo, Cláudio Lembo (PFL). Ele recebeu a reportagem em seu gabinete, onde falou quase sem parar por duas horas e meia, só interrompendo suas digressões para tragar seis cigarros Minister. Conhecido por sua verborragia, reclamou que não foi ouvido pela sociedade civil nos últimos cinco anos. "Só agora comecei a ser ouvido. De uma forma polêmica? Lamento, não queria ter essa pecha de polêmico gratuitamente. Mas não fiz curso de simpatia. Vim para trabalhar", afirmou. Leia os principais trechos:
 

FOLHA - Por que só depois de três meses do primeiro ataque do PCC é que as autoridades parecem estar agindo de forma integrada?
SAULO DE CASTRO ABREU FILHO
- É a vantagem da crise e das eleições. Nesse período, as pessoas se mexem. Lamento que seja em ano eleitoral e em final de governo. Nessa situação, qualquer coisa que se faça tem uma exploração eleitoral.

FOLHA - Mas não havia integração antes?
ABREU FILHO
- Grito há cinco anos. É minha maneira de me expressar. Mas ninguém me ouvia e as investigações conjuntas não andavam. Ninguém queria trazer a responsabilidade pela segurança pública para si. Elegeram a segurança para Geni. Ninguém queria por a mão. Mas agora, com a proximidade das eleições, todo mundo quer maquiar a Geni.

FOLHA - Onde o governo errou?
ABREU FILHO
- O que demorou foi a comunicação para mostrar o que estava sendo feito pelos governos. Faltou alto-falante para essa voz. E agora veio, com a eleição e a pauta da imprensa. O poder da imprensa sobre o mundo político é incomensurável, quase alucinante. Eles [os políticos] vivem em função do que vai sair no jornal amanhã.

FOLHA - Mas não houve erro no combate ao crime organizado?
ABREU FILHO
- Há décadas o sistema bancário sabe exatamente o movimento nas contas de cada um. Sabem tudo, diariamente. Esse pessoal [do PCC] usa o sistema bancário para lavar dinheiro, com esse monte de conta de laranjas, o mesmo esquema de doleiros. Faltava vontade política de investigar.

FOLHA - Como garantir que agora a ação integrada vai dar resultado?
ABREU FILHO
- É necessário que a imprensa fique em cima dos políticos, tipo chega de factóide, cobrando soluções reais para os problemas. Aí, vamos conseguir mudar. Também temos de desidratar financeiramente o crime, deixar com cara de maracujá velho. Se mantivermos o crime como uma fruta saborosa, tentadora, as menininhas da favela vão continuar glamurizando e vamos ter milhões de presos no Brasil. O PCC tem se alimentado da miséria e da opressão, principalmente nos bairros carentes. O PCC é hoje o Bolsa-Família da favela. É a organização criminosa que paga o enterro de quem morre pela causa e que constrói barracos e dá comida para muita gente. E assim vão conquistando adeptos. Faltam políticas de Estado no Brasil, políticas que transcendam pessoas e partidos. Precisamos fazer campanhas contra a violência como fazemos contra a poliomielite, em que autoridades e população se dedicam a uma causa comum.

FOLHA - O senhor fala no fim dos factóides e da disputa política, mas dias atrás ameaçou deixar o cargo se o dinheiro prometido pelo governo federal chegasse a São Paulo.
ABREU FILHO
- Fui mal compreendido.


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