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MOACYR SCLIAR
Nomes e produtos
Pais dão nome de produtos a bebês.
Levantamento realizado em cartórios civis do interior de São Paulo e
da capital paulista revela que cresceu
o número de famílias registrando os
filhos como Bonna (margarina), Eno
(antiácido), Adria (massas), Ariel
(sabão em pó) e Gillette (lâmina de
barbear). Nos EUA, a marca Lexus,
da Toyota, emprestou o seu nome
para 311 meninas no ano passado.
Ainda fazem parte dos nomes preferidos pelos americanos as marcas Armani, Chanel, Porsche, Fanta, Guiness e Nivea. Folha Dinheiro,
11.out.03
Se havia pessoa que Rosana invejasse, era sua cunhada Camila. Não sem razão,
aliás; notável empreendedora, tudo que Camila fazia dava certo.
Durante anos trabalhara para
empresas que ajudara a enriquecer, até que por fim decidira abrir
o seu próprio negócio. E tudo indicava que teria êxito; o plano era
fabricar um novo produto alimentício, uma mistura de cereais
denominada Mix. Por coincidência, Rosana tinha acabado de ter
um bebê, uma menina, e precisava registrá-la. No cartório, quando a encarregada perguntou que
nome teria a criança, não hesitou:
Mix, respondeu, prontamente.
O marido ficou furioso. Haviam
combinado que o nome da filha
seria Daniela; mesmo que Rosana
quisesse mudar, não poderia fazê-lo sem consultá-lo. E, sobretudo, não poderia ter escolhido um
nome tão estranho. Rosana, porém, simplesmente ignorou a raiva do marido: com o nome de
Mix, a menina certamente seria
uma vencedora; afinal, Camila
nunca errava. A cunhada, por
sua vez, sentiu-se envaidecida e
prometeu que a sobrinha receberia Mix de graça por toda a vida.
Isso, no entanto, não aconteceria. Por uma única razão: Mix (o
produto, não a menina) não deu
certo. Apesar de todas as pesquisas prévias, de todos os estudos, o
público simplesmente ignorou a
nova mistura de cereais. Em breve Camila fechava a empresa.
Não desistiu, contudo. Agora fabricaria um detergente chamado
Alva, que tinha tudo para emplacar. Quando Rosana ouviu a notícia, ficou perplexa; mas, logo em
seguida, decidiu: foi ao cartório e
trocou o nome da filha de Mix para Alva. De novo, o marido teve
um ataque de fúria; de novo, ela o
ignorou.
Alva, infelizmente, não emplacou; três meses depois, a empresa
estava fechada, e Camila partiu
para Kela, uma nova marca de
sorvete. Alva, ex-Mix, virou Kela.
E depois virou Trina (alimento
para pássaros). E depois virou
Gula, bolacha recheada.
Nada funcionava. Mesmo assim, e apesar de a filha já estar
com um ano e meio, Rosana não
desistia. Quando Camila disse
que iria fabricar sandálias, de
imediato perguntou a marca.
Mas desta vez Camila não lhe disse; tinha uma proposta diferente.
No novo ramo, enfrentaria um
poderoso concorrente, o fabricante da famosa sandália Thespis.
Pois esse era o nome que Rosana
deveria dar à filha. Baseada na
experiência anterior, Camila estava segura de que a fábrica
Thespis em breve estaria quebrada.
Nomes, como se sabe, são coisas
poderosas. Condicionam o destino das pessoas. E às vezes são capazes até de revolucionar o mercado.
Moacyr Scliar escreve às segundas-feiras, nesta coluna, um texto de ficção baseado em matérias publicadas no jornal.
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