São Paulo, quarta-feira, 20 de novembro de 2002

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TRANSPORTES

Artesp, que controla as concessionárias de rodovias estaduais, paga R$ 40 milhões a empresas para ajudá-la no serviço

Agência "terceiriza" fiscalização de estradas

ROBERTO COSSO
DA REPORTAGEM LOCAL

Criada em abril de 2002 para fiscalizar as rodovias estaduais sob regime de concessão para a iniciativa privada, a Artesp (Agência Reguladora de Serviços Públicos Delegados de Transporte do Estado de São Paulo) contratou dez empresas fiscalizadoras por quase R$ 40 milhões.
Segundo especialistas em direito administrativo ouvidos pela Folha, a contratação é ilegal por terceirizar uma atividade-fim da Artesp, que é uma autarquia especial criada exclusivamente para fazer fiscalização. Além disso, a terceirização pode levar à anulação das multas aplicadas.
A Artesp argumenta que a lei que a criou previu um quadro de pessoal "extremamente enxuto" e, por isso, não tem condições de fazer toda a fiscalização sem contratar empresas para auxiliá-la. São 78 funcionários, divididos em seis diretorias, além da ouvidoria.
A autarquia nega, porém, que esteja terceirizando uma atividade-fim.
De acordo com a Artesp, as empresas fiscalizadoras fornecem auditores para as diretorias de Controle Econômico, que verifica a situação econômico-financeira dos contratos e das concessionárias de estradas, e de Investimentos, que controla as obras feitas pelas concessionárias.
A atividade mais importante das empresas seria na diretoria de Operações, que faz a fiscalização dos equipamentos, da conservação e do funcionamento das rodovias.
Cabe às empresas fiscalizadoras verificar, por exemplo, o tempo que as concessionárias demoram para remover um pneu que eventualmente caia na pista ou o número de carros que fazem fila para passar pelos pedágios. Quando a fiscalizadora verifica alguma irregularidade, avisa a Artesp, que notifica a concessionária para apresentação de defesa prévia.
Se a defesa não for convicente, o processo segue até que a Artesp propõe uma penalidade, que pode ser advertência, multa ou até o rompimento do contrato. A concessionária tem direito de apresentar recurso ao Conselho Diretor da Artesp, formado por todos os diretores da autarquia especial.

Legalidade
O advogado Marcelo Figueiredo, professor da PUC-SP, disse que a fiscalização deve ser exercida diretamente pela Artesp, em virtude dos dispositivos da Lei de Concessões.
Apesar de reconhecer que, em alguns casos, a agência pode contar com a colaboração de terceiros, como na hipótese de contratação de uma empresa de auditoria, ele afirma que os contratos da Artesp acabam por terceirizar a atividade-fim, o que é ilegal.
De acordo com Figueiredo, não se pode criar uma autarquia com a finalidade de fiscalizar se ela não tem condições de realizar a tarefa. "O Estado tem de planejar suas atividades, exatamente para que isso não ocorra."
O promotor Nilo Spinola Salgado Filho, da Promotoria de Justiça da Cidadania da Capital, também vê terceirização da atividade-fim da Artesp. Segundo ele, as multas eventualmente aplicadas pela agência podem vir a ser questionadas na Justiça, porque apenas servidores públicos têm legitimidade para exercer a fiscalização em nome do Estado.
Salgado Filho diz que, em tese, a terceirização da fiscalização também pode configurar fraude à obrigação do Estado de contratar por meio de concurso público. "Se a Artesp terceiriza as atividades que deveria realizar, por que ela foi criada?"
A licitação para escolha dos 12 consórcios de empresas que iriam colaborar com a Artesp na fiscalização dos contratos foi lançada no ano passado, antes da criação da agência, pela Comissão de Concessões da Secretaria de Estado dos Transportes.
Os contratos têm duração de 30 meses e valores que variam entre R$ 2,5 milhões e R$ 4,7 milhões. Três dos 12 contratos ainda não foram assinados em virtude de falta de dotação orçamentária.
Na edição de 8 de novembro, a Folha informou que a Artesp contratou sem licitação, em regime de emergência, um escritório de advocacia por R$ 1,5 milhão, pelo período de seis meses, sob a justificativa de que a lei que criou a agência transferiu para ela a responsabilidade de pelas ações judiciais referentes a questões de transporte, sem prever um quadro de procuradores para fazer a defesa da autarquia na Justiça.


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