São Paulo, domingo, 20 de dezembro de 2009

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Psicólogo do Natal, Papai Noel presenteia adulto com conselhos

Além das crianças, manifestam seus desejos ao bom velhinho pessoas que querem casar, buscam cura de doença ou um emprego

Papai Noel do shopping Frei Caneca conta que já viu "muito adulto chorar" na sua frente e que aprendeu na prática a lidar com isso

RICARDO WESTIN
DA REPORTAGEM LOCAL

O trabalho oficial do Papai Noel, todo mundo sabe, é ouvir quais presentes as crianças querem ganhar no dia 25. Mas, quando aparecem adultos bem crescidos com seus próprios pedidos, o bom velhinho acaba sendo obrigado a fazer um bico como psicólogo, ombro amigo e até santo milagreiro.
"Um mulher muito bem vestida esteve aqui com o filho de seis anos, mas quem quis falar comigo não foi ele. Foi ela", conta Eduardo de Barros, 59, o Papai Noel do shopping Iguatemi de São Paulo.
A mãe baixou o tom da voz para que o menino não ouvisse e, narra o Papai Noel, falou muito séria: "Sou uma empresária de sucesso e tenho dinheiro para viver bem, mas ainda me falta algo. Gostaria muito que o senhor me trouxesse uma companhia que me ame e que aceite meu filho".
Diante daquele pedido sincero, Barros ficou paralisado. Esteve a ponto de dizer: "Eu não sou essa pessoa que as crianças pensam que eu sou...". Mas, após uma breve hesitação, lembrou-se de "O Poder do Subconsciente", um best-seller que havia acabado de ler, e pregou:
"Você deve mentalizar o que quer. Pense nele à noite, quando estiver quase dormindo, e de manhã, assim que acordar. Dessa forma, você vai criar a realidade no seu interior, e o universo vai conspirar".
O rosto daquela mulher se iluminou: "No ano que vem, tenha certeza, eu vou trazer o meu novo marido para o senhor conhecer".
Os Papais Noéis espalhados pela cidade escutam adolescentes que desejam passar no vestibular, desempregados que precisam encontrar trabalho e doentes que querem a cura.

Choro
Os adultos normalmente ficam observando de longe. Só se aproximam do Papai Noel quando não há mais nenhuma criança na fila. "Acho que sentem vergonha. Não de mim, mas das pessoas que estão passando", afirma Walter Prieschl, 58, sentado num trono vermelho no shopping Frei Caneca.
Prieschl já viu "muito adulto chorar" na sua frente. "Nos cursos de Papai Noel, ensinam como dizer "ho ho ho" e conversar com a criança, mas não como reagir a esse tipo de situação. Foi na prática que aprendi", afirma. Quando se vê diante de um desejo sincero de um adulto, ele diz que vai rezar para que se torne realidade.
De acordo com o psicólogo e professor Aluízio Lopes de Brito, do Conselho Federal de Psicologia, a pessoa que acreditou no Papai Noel quando criança carrega esse imaginário de alguma forma na vida adulta.
"Essas pessoas sabem que o Papai Noel não existe, claro. Mas, em momentos de grande dificuldade, elas recorrem a alguém ou a alguma coisa que realize o que parece ser impossível. O Papai Noel tem esse poder. Dependendo do momento, elas enxergam o próprio Deus naquele senhor com barba."
José Caruso, 68, o bom velhinho do shopping Eldorado, já ouviu mulher com problemas conjugais, jovem com o cachorro doente e pai que não via a filha havia anos. "Não basta botar a roupa vermelha e o gorro. É preciso ser Papai Noel com o coração. As pessoas dependem de você. É uma baita responsabilidade. Se não tiver o dom, você não aguenta dez dias aqui."
Caruso fica feliz quando chegam adultos agradecidos por desejos tornados realidade. "As pessoas dizem "obrigado", e nem sei o que foi que eu fiz", conta, entre risos.


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