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ADMINISTRAÇÃO
Segundo secretário, falta dinheiro e há impedimento legal para quitar dívida de R$ 970 mi deixada por Pitta
Sayad diz que só vai pagar gastos de Marta
JOÃO CARLOS SILVA
DA REPORTAGEM LOCAL
A política de pagamentos traçada pela Prefeitura de São Paulo
para este ano prevê prioridade para despesas contratadas pela administração da prefeita Marta Suplicy (PT), segundo o secretário
das Finanças, João Sayad.
Com a decisão, explicada pelo
secretário por impedimentos previstos em leis e por falta de recursos, uma dívida de cerca de R$ 970
milhões da prefeitura deixará, pelo menos inicialmente, de ser paga a fornecedores, por exemplo.
"Além de não ter dinheiro, nós
não temos autorização nem do
Orçamento nem da Lei de Responsabilidade Fiscal."
Só com as empresas que fazem
o serviço de coleta de lixo e varrição, há R$ 252 milhões em dívidas
deixadas pela administração do
ex-prefeito Celso Pitta (PTN), segundo o secretário.
"Não quer dizer que não pagaremos nunca, mas agora não temos perspectiva", disse Sayad em
entrevista à Folha.
O secretário disse esperar que a
pendência com credores não afete
o fornecimento e a prestação de
serviços à prefeitura.
Ele também voltou a reafirmar
que não pagará no ano que vem
uma parcela extra de R$ 2,1 bilhões da dívida de R$ 10,5 bilhões
renegociadas com a União.
O acordo prevê que se o pagamento não for feito haverá aumento da taxa de juros anual das
parcelas restantes, de 6% para 9%.
Se o calote se confirmar, haverá,
ainda, aumento da despesa com
as parcelas mensais da dívida.
Quanto à possibilidade de a prefeitura conceder reajuste aos servidores, Sayad afirmou que não
há mudanças previstas nas regras
atuais, diferentemente do que deu
a entender a prefeita durante a semana. Leia a seguir os principais
trechos da entrevista.
Folha - Na quarta-feira, o governador Mário Covas (PSDB) disse
que os novos prefeitos deveriam,
em vez de reclamar da situação financeira que herdaram, traçar um
plano para saneá-la. O puxão de
orelha serve para São Paulo?
João Sayad - Acho que o governador Mário Covas, que tem toda
minha simpatia, amizade e solidariedade, está com a perspectiva
de tempo errada. Nós estamos no
governo há 19 dias. E o que tem sido falado, pelo menos pela Prefeitura de São Paulo, é uma revelação necessária da situação que está sendo encontrada. Não se trata
de reclamação, de rabugice nem
de choro. Nós vamos resolver.
Acho que ele (Covas) foi um pouco afobado ao dizer que está na
hora de fazer alguma coisa.
Folha - Do cerca de R$ 1 bilhão de
dívidas "congeladas", deixadas
com fornecedores pelo ex-prefeito
Celso Pitta (PTN), quanto se refere
às empresas de lixo?
Sayad - Temos um atraso, para o
qual não temos nenhuma perspectiva de pagamento nem espaço orçamentário legal para pagar,
de R$ 252 milhões.
Folha - Então esse valor não vai
ser pago agora nem...
Sayad - Não tem perspectiva.
Não quer dizer que não pagaremos nunca, mas agora não temos
perspectiva.
Folha - E há alguma reação das
empresas?
Sayad - Tenho conversado. A
política financeira da prefeitura,
daqui para a frente, é pagar o corrente pontualmente. O que nós
contratarmos e o que estiver no
Orçamento readequado será pago
corretamente, pontualmente.
Folha - E as dívidas passadas?
Sayad - O passado nós não podemos (pagar). Além de não ter
dinheiro, nós não temos autorização nem do Orçamento nem da
Lei de Responsabilidade Fiscal.
Faltam três coisas, por ordem de
importância: dinheiro, espaço no
Orçamento e que a lei das finanças públicas autorize.
Folha - Por serem suspeitas?
Sayad - Não, não. Até pode ser,
mas não é por isso. É porque pela
lei 4.320, das finanças públicas, e
pela Lei de Responsabilidade Fiscal você não pode pagar empenhos (reservas de recursos) do
Orçamento anterior para os quais
não haja disponibilidade (de recursos, no ano seguinte). Então
faltam três condições. Por ordem:
não está no Orçamento (deste
ano), há impedimento pela Lei de
Responsabilidade Fiscal e não
tem dinheiro.
Folha - Qual é o valor dessas pendências todas da gestão Pitta?
Sayad - São R$ 970 milhões.
Folha - E em relação à declaração
do sr. sobre a impossibilidade de a
prefeitura pagar no ano que vem
20% da dívida de R$ 10,5 bilhões
renegociada com União? O sr. disse
que vai ser impossível fazer o pagamento dos R$ 2,1 bilhões. Qual é a
diferença entre dizer que é "impossível" e que não vai pagar?
Sayad - Acho que não tem diferença. Mas o que estou dizendo é
que não vai ser pago porque é impossível. Não é uma declaração
bombástica. Não é uma novidade.
Veja: nós devemos R$ 15 (bilhões), para dar um número redondo. Para pagar 20% em 2002,
vamos pagar R$ 3 (bilhões). Como é que uma prefeitura que arrecada R$ 7 (bilhões) pode pagar R$
3 (bilhões) no ano de 2002? Essa é
a declaração que eu dei, o Greenspan (Alan Greenspan, o presidente do Federal Reserve, o banco
central dos EUA) daria, o Malan
(Pedro Malan, ministro da Fazenda), o contador-geral das finanças
municipais, o secretário do Tesouro Nacional. Todos sabem.
Folha - Mas...
Sayad - Já está previsto o que
acontece. Nós somos onerados
com juros maior, de 6% para 9%
(ao ano), e com um pagamento
maior, e equivalente a 15% (atualmente, o limite de gasto anual
com a dívida é de 13% da receita
com tributos municipais).
Folha - Para evitar o aumento da
taxa não valeria privatizar?
Sayad - Primeiro: não sei se o valor deles é esse (os R$ 2,1 bilhões
da parcela extra de 2002). Segundo: alguns dos bens públicos só
um não-habitante da cidade de
São Paulo poderia pensar em vender. Eles são importantes em termos de trânsito. Ninguém quer
maximizar a utilização dos bens
públicos, como o Pacaembu.
Folha - Em Brasília, a declaração
do sr. sobre a impossibilidade de
pagar os 20% da dívida (há ainda
parcelas mensais que, neste ano,
podem totalizar R$ 913 milhões)
foi recebida como um movimento
de pressão por uma renegociação.
Sayad - Não há dúvida de que é
nosso dever e nossa obrigação batalhar pelas melhores condições
para a Prefeitura de São Paulo.
Folha - O governo tem se mostrado bem resistente. Eles dizem que
não será possível renegociar.
Sayad - A minha função é conseguir as melhores condições para a
cidade de São Paulo.
Folha - O sr. já chamou a eventual
taxa de juros de 9% ao ano de extorsiva. Que taxa não seria? Os 6%?
Sayad - 6% é a caderneta de poupança. O próprio governo está
pensando que a caderneta de
poupança é uma taxa muito alta.
Não sei, precisa ser discutido. É
um empréstimo (com prazo de
pagamento) de 30 anos.
Folha - Como secretário, o sr. tem
essa avaliação. E um banqueiro como avaliaria essa taxa de 9%?
Sayad - Falar em um empréstimo de 30 anos com correção mais
6% é razoável. 9% é muito alto.
Folha - Um banqueiro teria esse
ponto de vista?
Sayad - Para um banqueiro, você tem de ver a taxa que ele paga e
o que ele recebe. É diferente.
Folha - Antes da posse o sr. tinha
dito que o primeiro ano da administração não seria muito brilhante, que haveria a política do "cobertor curto" e que seria difícil implantar os projetos sociais. Agora...
Sayad - Não. Sempre disse que ia
fazer uma previsão dos projetos
sociais. Quando eu fizer a previsão, tenho de assinar um termo de
compromisso, por causa da Lei de
Responsabilidade Fiscal, dizendo
que consegui os recursos, que eles
vêm dessa e dessa origem e que é
ele um recurso que existirá para o
ano um, ano dois, ano três, ano
quatro e subsequentes.
Folha - Apesar dessa dificuldade
financeira, a prefeita Marta Suplicy
já disse que pensa em estudar um
reajuste para os servidores...
Sayad - Não, aí está mal colocado, e ela me falou sobre isso hoje
(anteontem). Também as minhas
palavras saíram erradas. Não é
verdade isso. Nós não temos condições de dar reajuste. A verdade
é: pela lei em vigor foi dado um
reajuste de 3,26% (aos servidores). O governo anterior, entre as
suas últimas atividades, deixou
para dar esse aumento no final do
ano. É um aumento legal, e é esse
que está sendo concedido.
Folha - Além disso...
Sayad - Não tem nada em discussão.
Folha - E é possível discutir?
Sayad - Não. Nós estamos muito
apertados, muito apertados.
Folha - A declaração da prefeita,
então, tratava dos 3,26%?
Sayad - É. E a minha também.
Fora isso, não há novidade.
Folha - Está prevista no programa
de governo da prefeita a implantação do IPTU progressivo. No programa, há uma menção sobre a
aplicação de recursos, arrecadados
com a nova forma de cobrança, em
habitação. Seria isso mesmo?
Sayad - Não, não pode vincular.
Folha - Há algum dado sobre o incremento de arrecadação que o IPTU progressivo pode trazer?
Sayad - Não. Vou fazer a primeira reunião com a diretoria toda
das Finanças. Vamos discutir.
Folha - Não há estudo, mas, em
campanha no ano passado, o ex-prefeito Paulo Maluf (PPB) prometeu aumentar isenções e aumentar
em 15% o IPTU de grandes empresas e bancos...
Sayad - Não, você não pode tributar por atividade. Só em residencial e em não-residencial. Não
sou expert ainda em IPTU, mas
você não pode fazer isso: tributar
shopping center etc. E as isenções
que o Maluf dá (ofereceu em campanha à prefeitura) nós também
damos. Já estão aí. Os pequenos
imóveis continuarão isentos.
Folha - O Orçamento participativo começa neste ano?
Sayad - Começa.
Folha - O sr. tem idéia de quanto
será reservado do Orçamento para
a população discutir a aplicação?
Sayad - O que eu faço todos os
dias é dizer que não tenho idéia de
nada que implique mais despesas.
Folha - Vocês estão fazendo a readequação do Orçamento 2001, de
R$ 8,1 bilhões. Como é isso? É fácil?
Vocês vão tirar verbas de onde?
Sayad - Não, não é fácil. Estamos
comprimindo todas as despesas
da prefeitura. Temos verbas próximas a zero para investimento.
Não tem nada de fácil.
Folha - Quanto à Lei de Responsabilidade Fiscal, a prefeita tem dito
que faria mudanças. E o sr.?
Sayad - Uma coisa, que daqui a
pouco não é relevante, é ter disposições transitórias. Esse R$ 1 bilhão (em dívidas) cancelado pelo
Pitta é uma violência para os fornecedores e para nós.
Folha - Como ficaria?
Sayad - Teria de ter uma previsão: primeiro ano é x, segundo
ano é y. Você não pode deixar restos a pagar (dívidas) sem disponibilidade (de recursos, para pagamento no ano seguinte). Está
bom. Mas eu já tenho. O que eu
faço? Primeiro ano (pago) 20%,
segundo 30%...
Folha - Os fornecedores encaram
com normalidade o fato de não receberem? O sr. não tem problemas
para manter os serviços que eles
prestam à prefeitura?
Sayad - Não sei. Espero que sim,
pois estou explicando a situação
da prefeitura. Entende?
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