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São Paulo, sexta-feira, 21 de fevereiro de 2003

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RIO

Defensoria Pública considera que novo Código Civil permite liberar quem cometeu irregularidade e tem entre 18 e 21 anos

Jovem infrator pode ter soltura antecipada

Ana Carolina Fernandes/Folha Imagem
Jovens infratores esperam audiência na 2ª Vara da Infância e da Juventude; ao centro, um deles segura um exemplar da Bílblia


FERNANDA DA ESCÓSSIA
DA SUCURSAL DO RIO

A Defensoria Pública do Rio de Janeiro quer aproveitar o que considera ser uma brecha criada pelo novo Código Civil para mandar para casa cerca de 280 jovens de 18 a 21 anos acusados de cometer infrações e que, hoje, estão internados em unidades de recuperação do Estado.
Os defensores públicos já estão solicitando à Justiça do Rio habeas corpus para esses jovens. A medida vem gerando polêmica, pois uma decisão favorável das Câmaras Criminais pode criar jurisprudência e provocar um efeito cascata em todo o país.
O argumento da Defensoria Pública é o seguinte: com o novo Código Civil e o estabelecimento da responsabilidade civil aos 18 anos, o Estado perderia a competência para substituir a família na reeducação desses jovens infratores, aplicando-lhes as chamadas medidas socioeducativas.
Pelo novo código, que está em vigor desde o início do mês passado, a idade para obtenção da plena autonomia civil cai de 21 anos para 18 anos. Com essa idade, o jovem se torna totalmente independente dos pais e pode praticar todos os atos da vida civil, como casar ou ser responsável por realizar contrato.
É justamente esse ponto que a Defensoria quer aproveitar. Argumenta que não há sentido na aplicação de medida socioeducativa (considerada uma sanção para pessoas ainda em desenvolvimento) para quem já alcançou a maioridade civil. Como esses jovens cometeram irregularidades com menos de 18 anos, idade mínima de responsabilidade criminal, tampouco podem ser presos.
Ou seja, com o habeas corpus, iriam para casa. Em caso de reincidência criminal, responderiam processos judiciais com base no Código Penal, como adultos.
Hoje, o jovem infrator, ao completar 18 anos, tem a ficha criminal zerada e volta a ser primário. As irregularidades praticadas até então constam do prontuário policial como maus antecedentes.

Legislação
De acordo com o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), esse jovem poderá, mesmo com a ficha zerada, continuar interno em unidades de recuperação por um período máximo de três anos ou até os 21 anos.
A coordenadora de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente da Defensoria Pública, Simone de Souza, disse que há, no momento, uma lacuna na lei, pois não estão contemplados os casos dos jovens de 18 a 21 anos.
Souza considera que, ao pedir habeas corpus para os jovens, está defendendo os interesses deles. Para a defensora, o Estado não tem sido eficaz na recuperação deles e, por isso, a medida beneficiará não só os jovens eventualmente liberados, mas também os adolescentes que continuarem nos institutos.
"Você vê jovens de 19 anos, com mais experiência, influenciando negativamente os adolescentes de 12, 13, 14 anos, que ainda têm chance de efetiva recuperação. As unidades passam a ser verdadeiras escolas do crime", afirma.
Com a saída dos jovens mais velhos, diz Souza, o Estado poderia ter mais sucesso na reeducação dos demais. Ela afirma que não defende a impunidade e não pedirá o habeas corpus em casos de crimes mais graves.
"Pelo bem-estar da sociedade, quando se tratar de jovem que cometeu crime bárbaro e a Defensoria entender que o melhor para ele é continuar na unidade, a gente não vai pedir o habeas corpus."


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