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Para STF, furto de pequeno valor não é crime
Todos os ministros da Corte já se manifestaram favoráveis a soltar acusados de, por exemplo, furtar violão, alicate, entre outros
Não há a obrigatoriedade de
todos os magistrados do país
seguirem essa conduta, mas
sinaliza que, nesses casos, não
devem ser aplicadas penas
FELIPE SELIGMAN
SOFIA FERNANDES
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Furtos de pequeno valor não
devem ser considerados crimes, conforme já se manifestaram todos os ministros do STF
(Supremo Tribunal Federal)
em julgamentos do tribunal.
Levantamento do próprio Supremo mostra que em ao menos 14 casos julgados em 2008,
a Corte considerou "insignificante" os delitos praticados.
Ao analisar recursos (habeas
corpus) que chegaram à Corte,
os ministros mandaram arquivar ações penais que corriam
na primeira instância (etapa
inicial do processo), mandando
soltar aqueles que ainda estavam presos por casos como o
furto de um violão, de um alicate industrial, entre outros.
Os recursos chegaram ao Supremo após passar por todas as
instâncias -normalmente três.
A conduta, já pacificada entre os ministros da cúpula do
Judiciário brasileiro, não deve
ser obrigatoriamente seguida
pelos demais magistrados do
país. Serve, porém, como uma
clara sinalização às instâncias
inferiores para que deixem de
aplicar penas em casos de crimes considerados de "bagatela" (baixo valor). Caso contrário, suas decisões serão revertidas quando chegarem ao STF.
Também é uma tentativa do
Supremo de mostrar que não
são apenas os ricos e que têm
acesso a advogados que conseguem decisões favoráveis no
tribunal. O presidente do STF,
ministro Gilmar Mendes, recebeu críticas em 2008 por ter
mandado soltar por duas vezes
o banqueiro Daniel Dantas.
Os casos de crimes de "bagatela", porém, são analisados individualmente, já que as razões
que levam à prática dos pequenos furtos podem variar. "Normalmente, essas pessoas são
movidas por extrema carência
material e eu sou muito sensível a isso. São casos em que o
princípio da insignificância deveria ser aplicado na análise da
ação penal, ainda na primeira
instância", disse o ministro
Carlos Ayres Britto.
O princípio aplicado considera "irrelevante" os casos em
que o envolvido não apresenta
"a mínima ofensividade, nenhuma periculosidade social,
reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e
inexpressividade da lesão", de
acordo com definição do ministro Celso de Mello.
A Folha teve acesso aos processos dos considerados crimes de bagatela. O furto de
uma garrafa de catuaba, uma
garrafa de conhaque, um saco
de açúcar e dois pacotes de cigarro, produtos com valor de
R$ 38, por exemplo, chegou ao
STF no ano passado. Em outro
caso, os ministros julgaram o
furto de uma carteira com documentos e R$ 80 em espécie.
Todos os dez ministros da
Corte que compõem as duas
turmas existentes no tribunal
já se manifestaram contrários a
tipificação de crime em casos
como esses. Gilmar Mendes,
que não participa das turmas,
também defende a insignificância desses crimes.
"Temos reconhecido que é
crime de bagatela e afastamos a
ilicitude do caso. Mas precisamos sempre observar as circunstâncias", diz o ministro
Marco Aurélio Mello. "O STF
tem feito uma distinção entre o
formal e o material. Formalmente é crime, materialmente,
não", complementa Britto.
A análise destes casos pelo
Supremo reflete a atual situação do Judiciário no país. Reportagem da Folha de dezembro de 2008 mostrou que há
estimativa de que até 9.000
pessoas seguem presas mesmo
com suas penas já cumpridas.
Levantamento do CNJ (Conselho Nacional de Justiça)
também mostra que, pelo excesso de processos, 60% das
ações não são analisadas no
ano em que são protocoladas.
O Supremo também aplicou
o princípio da insignificância a
militares criminalizados pelo
porte de pequenas quantias de
droga. Em um desses casos, por
exemplo, um ex-soldado gaúcho foi condenado pela Justiça
Militar a um ano de reclusão
pelo porte de 26 mg de maconha, o que foi revertido no STF.
Nestes casos, porém, não há
unanimidade. Muitos dos ministros consideram que o uso
de drogas em serviço compromete a atuação profissional.
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