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LETRAS JURÍDICAS
Não espolio, sou espoliado
WALTER CENEVIVA
Colunista da Folha
O moto de São Paulo, "non
ducor, duco" ("Não sou conduzido, conduzo"), pode ser adaptado à resposta que o Estado
tem dado ao senador Antonio
Carlos Magalhães (PFL-BA),
negando que sua economia seja
espoliadora dos demais Estados,
mas, ao reverso, que recursos
daqui, desviados para outras regiões, ficam perdidos nas mãos
de políticos interessados na satisfação dos próprios interesses.
Há algo de insinceridade dos
dois lados. O senador baiano joga para a arquibancada, onde
sempre é possível obter bons lucros políticos, fazendo crítica a
São Paulo. Compondo o mais rico grupamento brasileiro, com
renda "per capita" próxima dos
níveis do primeiro mundo, a
gente paulista - com suas indústrias, especialmente a automobilística - sabe que seu
principal cliente é o conjunto
dos demais Estados brasileiros.
Até aqui o leitor não viu nada
de jurídico nos primeiros parágrafos, de modo que chegou a
hora de explicar. Aproveito como "gancho" o próximo aniversário da cidade.
São Paulo tem ficado fora do
mando nacional, desde 1930,
com Getúlio Vargas. Ao tempo
dos militares, o Executivo nunca
foi ocupado por um paulista.
Depois deles, também não, embora Fernando Henrique Cardoso seja outro paulista que não
nasceu aqui. No Legislativo, tomado o exemplo do Senado,
tem-se um paradoxo constitucional.
São Paulo, com seus 33 milhões de habitantes, tem três senadores, número igual ao de cada uma das demais unidades
da Federação, como - para citar apenas três, com as respectivas populações - o Acre (480
mil), Amapá (350 mil) e Roraima (280 mil). Na Câmara dos
Deputados, presidida pelo professor Michel Temer (PMDB-SP), embora o artigo 45 da Carta diga que a representação por
Estado será proporcional à sua
população, logo limita o mínimo a 8 e o máximo (eis São
Paulo contido) a 70 deputados.
Resultado: Acre, Amapá, Amazonas, Espírito Santo, Mato
Grosso, Piauí, Rio Grande do
Norte, Rondônia, Roraima, Sergipe e Tocantins, que, somados,
têm população menor que a
paulista, ostentam, em conjunto, representação maior que a
dos bandeirantes, na Câmara.
Os paulistas geram cerca da
metade das questões judiciais
discutidas no STF (Supremo
Tribunal Federal) e no STJ (Superior Tribunal de Justiça). Deve ser grande o número de juízes paulistas nesses tribunais,
pensará o leitor, estranho às
coisas da magistratura. Ledo
engano. Também lá a participação paulista é pequena, menor no STJ (dos 33 ministros, os
de São Paulo são menos que os
dedos de uma mão) que no STF.
Se na magistratura a questão
está mal posicionada, talvez seja o caso de reclamarmos na entidade que mais se destaca pelas
reivindicações de caráter nacional: a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil). Não é boa
idéia. O artigo 51 do Estatuto da
Advocacia (Lei nº 8.906/94) diz
que cada unidade da federação
tem três conselheiros federais.
Assim, das dezenas de conselheiros federais, três são escolhidos por São Paulo, embora aqui
atuem 150 mil advogados e Tocantins, por exemplo, tenha
cem vezes menos.
Cabe discutir se tais números
devem ser mantidos. Convém
alguma correção do desequilíbrio revelado, mas, de modo geral, a preservação é boa. Em primeiro lugar, porque o equilíbrio
entre o econômico e o político é
útil. Segundo, porque São Paulo
absorve, muito naturalmente, a
manifestação de gente vinda de
outros Estados, que elege. Em
terceiro e último lugar, porque o
objetivo constitucional de redução das desigualdades regionais
será facilitado no caminho a
percorrer.
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