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Advogado de Mendonça foi indicado a tribunal
ROBERTO COSSO
ENVIADO ESPECIAL A BRASÍLIA
IURI DANTAS
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O advogado Márcio de Assis
Borges, que conseguiu a libertação, pelo TRF (Tribunal Regional
Federal) da 1ª Região (em Brasília), do traficante Leonardo Dias
Mendonça, em 24 de janeiro de
2002, quase se tornou desembargador do mesmo tribunal, sete
anos antes da decisão que concedeu habeas corpus a Mendonça.
Por meio da Operação Diamante, a Polícia Federal investiga a
possibilidade de ter havido pagamento a juízes pela concessão de
habeas corpus a traficantes.
Com o apoio do desembargador Eustáquio Silveira, Borges foi
escolhido pelo TRF para integrar
lista tríplice que seria submetida
ao presidente da República para a
nomeação de um novo membro
do tribunal, no final de 1994.
Preterido por Itamar Franco,
Borges recebeu convite para trabalhar como assessor do desembargador Silveira, no próprio
TRF. Ficou na função de julho de
1995 a fevereiro de 1997.
Segundo revelaram grampos telefônicos feitos pela PF, Borges foi
apresentado a Mendonça pelo estudante de direito Igor da Silveira,
filho de Eustáquio Silveira. Quando ainda era adolescente, Igor foi
apresentado a Borges por seu pai.
Amizade antiga
O advogado e o desembargador
se conhecem desde 1983, quando
Silveira era juiz federal no Ceará e
Borges assumiu a chefia do departamento jurídico da CEF (Caixa
Econômica Federal) em Fortaleza. "Tenho um irmão que é advogado em Belo Horizonte e que havia trabalhado com o Márcio.
Meu irmão me recomendou que
o recebesse", relata Silveira.
Na época, o ex-deputado Pinheiro Landim, acusado pela PF
de intermediar a negociação de
habeas corpus, era presidente da
Assembléia Legislativa do Ceará.
A amizade do desembargador
com o deputado renderia frutos
sete anos depois, quando os dois
se reencontrariam em Brasília durante o primeiro mandato de Landim na Câmara.
"Pedi a ele [Landim" que empregasse meu filho [Igor da Silveira" como secretário parlamentar.
Meu filho ficou com ele nos dois
primeiros mandatos", conta o desembargador federal.
Segundo a Constituição, um
quinto dos tribunais é formado
por pessoas de fora da carreira da
magistratura. A OAB (Ordem dos
Advogados do Brasil) e o Ministério Público se alternam na indicação dos nomes que devem preencher essas vagas.
Cada vez que é aberta uma "vaga do quinto", uma das entidades
elabora uma lista de seis profissionais e a submete ao tribunal. Os
desembargadores escolhem três
nomes e, no caso dos tribunais federais, os enviam ao presidente
da República, que nomeia um.
Em 1994, Borges estava na lista
sêxtupla enviada pela OAB ao
TRF. Começou, então, a fazer
"campanha" entre os desembargadores e os visitou para apresentar-se e mostrar seu currículo.
Sob o compromisso de não terem seus nomes revelados, desembargadores do TRF da 1ª Região disseram à Folha que Silveira
pedia votos para Borges. Ele nega.
Realizada a votação, Borges ficou entre os três mais bem votados e teve seu nome incluído na
lista tríplice enviada pelo tribunal
ao presidente da República.
O então presidente Itamar
Franco preferiu o advogado Carlos Fernando Mathias de Souza,
que se tornou desembargador federal em 17 de fevereiro de 1995.
Homem de muitos amigos, Borges foi contratado pelo traficante
Mendonça para tentar obter um
habeas corpus no TRF da 1ª Região. A contratação foi mediada
por Igor da Silveira, filho de Eustáquio da Silveira e então funcionário de Pinheiro Landim -o deputado federal que renunciou ao
cargo no início do mês.
Levantamento nos arquivos do
tribunal mostra que o habeas corpus de Mendonça é o único processo criminal em que o advogado atuou. E obteve sucesso.
Borges esperou que o tribunal
estivesse em férias para entrar
com um pedido de habeas corpus.
Com uma quantidade menor de
desembargadores trabalhando,
seria mais fácil saber quem iria
julgar o processo.
O pedido caiu nas mãos do desembargador Fernando Tourinho
Neto, conhecido por suas posições liberais em relação à prisão
preventiva. Tourinho negou liminar ao pedido, mas votou a favor
da libertação de Mendonça. Foi
acompanhado no julgamento por
outros dois desembargadores.
Duas versões
Silveira apresentou duas versões conflitantes para sua relação
com o trabalho feito por Borges. À
Folha, no último dia 10, o desembargador negou que já tenha lido
petições feitas pelo advogado.
Questionado sobre se Borges já
havia mostrado alguma peça jurídica a ele, Silveira respondeu: "Às
vezes ele conversava comigo, em
tese [sem abordar casos específicos". Agora, trabalho que ele tenha feito e me mostrado, não."
A frase, porém, é contraditória
com outra, dita à Folha, em 18 de
dezembro. "O Márcio sempre teve muito orgulho do trabalho que
faz, porque ele realmente escreve
muito bem. Então, ele me mostrava o trabalho dele para eu elogiar.
Trabalhos feitos para a CEF e outros, como advogado particular.
Eu olhava assim, quase que sem
muita fixação, sem muita atenção,
e dizia para ele: "Tá bom, Márcio, é
isso mesmo, tal". Isso aí eu não
posso negar de maneira alguma."
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