|
Próximo Texto | Índice
RIO
Em 2002, Ministério da Defesa afirmou ter artefatos do mesmo lote dos apreendidos com traficantes; ontem, militares negaram tê-los
Minas são iguais às compradas pelo Exército
FABIANA CIMIERI
DA SUCURSAL DO RIO
RAFAEL CARIELLO
DE NOVA YORK
Em relatório de abril de 2002, o
Ministério da Defesa informou à
OEA (Organização dos Estados
Americanos) que o Exército brasileiro possuía minas terrestres
antipessoais do mesmo lote, tipo e
fabricante das oito apreendidas
anteontem pela polícia do Rio, na
favela da Coréia (zona oeste).
De acordo com o relatório, que
pode ser acessado pela internet
(http://www.oas.org/csh/english/documents/cp10031e07.doc), em
31 de dezembro de 2001, o Departamento de Logística do Exército
armazenava 7.416 unidades de
minas terrestres PRB M409, pertencentes ao lote I-35, exatamente
o mesmo das encontradas em poder do tráfico.
Ontem, o Exército negou à Folha que as armas façam parte de
seu arsenal. Segundo o chefe de
Comunicação Social do Comando Militar do Leste, coronel José
Barreto Júnior, um especialista do
Exército conferiu o número do lote com os registros informatizados da corporação.
"Tenho obrigação de dizer a
verdade. Nada, nada, nada pode
indicar que seja algum lote vendido para o Exército", disse Barreto
Júnior.
O Ministério da Defesa limitou-se a dizer, por meio da assessoria
de imprensa, que "não há registro, neste governo, de desvio de
minas" e que, a partir de hoje, o
ministério fará uma verificação
mais aprofundada para saber se
houve roubo ou furto desse armamento nos governos anteriores.
O diretor da divisão de armas da
organização Human Rights
Watch, Steve Goose, afirmou
acreditar que a mina tenha pertencido às Forças Armadas brasileiras. "Ela parece ter vindo de um
lote que o governo brasileiro reconhece ter", disse o especialista, se
referindo ao relatório enviado pelo país à OEA.
"Seria uma grande coincidência", afirmou Goose, "que uma
mina adquirida em outro país
viesse justamente do mesmo lote
vendido ao Brasil pela Bélgica.
Além disso, acrescentou, "quase
não há mais comércio internacional de minas, e a seqüência de lotes mencionados pelo país à OEA
[I-34, I-35, I-36] indica que devem
ter sido vendidos inteiramente
pelo fabricante belga ao governo
brasileiro".
Para um diplomata da OEA, especialista em minas, que preferiu
não ser identificado, só seria possível ter certeza de que essas minas pertenciam ao Exército brasileiro se, de fato, o país tivesse
comprado todo o lote.
Já o próprio coronel José Barreto Júnior afirmou que, legalmente, um fabricante não pode vender
o mesmo lote para compradores
diferentes. "É o que permite caracterizar o responsável." Ele disse ainda que as minas que o Brasil
possui, "em número mínimo",
são para treinamento das tropas.
Convenção
O documento enviado pelo governo brasileiro à OEA é parte de
informação oferecida voluntariamente pelos países signatários da
Convenção de Ottawa (Convenção sobre a Proibição do Uso, Armazenamento, Produção e
Transferência de Minas Antipessoal e sobre Sua Destruição).
Os países participantes do acordo se comprometem a destruir as
minas que possuam, não fabricá-las nem comercializá-las. Mas podem manter um estoque de minas
para pesquisa e preparação de especialistas por dez anos a partir da
ratificação do tratado.
Segundo Goose, entre todos os
signatários, o Brasil é o país que
mantém o maior número de minas para suposta pesquisa
-30.748, segundo o último relatório enviado à OEA. "O Brasil
ainda não deu uma explicação satisfatória sobre por que precisa de
mais minas para treinamento do
que qualquer outro país do mundo que assinou o acordo."
(Colaborou TALITA FIGUEIREDO, da Sucursal do Rio)
Próximo Texto: Fabricante muda nome e produção Índice
|