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Donos do antigo hotel Santos Dumont foram surpreendidos e deixaram o local; invasora diz que não tinha outra opção
Proprietários moravam em prédio invadido
DA REPORTAGEM LOCAL
A intenção dos sem-teto era
ocupar apenas prédios particulares vazios em São Paulo. Mas, em
um deles, os invasores depararam
com os próprios proprietários
dormindo no edifício.
O comerciante Mário Lobo
Yaakov Sznifer, 21, conta que ele e
seu pai estão entre os herdeiros do
imóvel que já foi sede do hotel
Santos Dumont, na rua Mauá, ao
lado da estação ferroviária da Luz.
"Foi meu avô quem construiu",
conta. "Quando os sem-teto arrombaram a porta e entraram, eu
pulei da cama, assustado, sem entender nada", afirma Sznifer, que
passou a madrugada dentro do
prédio, mas que saiu ontem à tarde do imóvel para ficar na casa de
parentes no interior do Estado. O
pai dele ficaria no apartamento de
um amigo na capital paulista.
"Vamos negociar com os sem-teto para que eles consigam dinheiro para comprar da gente.
Eles não podem nos prejudicar."
A família, que decidiu vender a
propriedade neste ano, após a
morte da avó, diz que ela está avaliada em R$ 5 milhões. Mas, segundo as lideranças dos sem-teto,
os donos não pagam IPTU há
mais de 20 anos (Sznifer confirma
que há atrasos, mas afirma não
saber desde quando).
Desde que nasceu, Sznifer vive
com sua família lá. "Eu tinha um
quarto isolado no 4º andar e meu
pai ficava no 2º andar. Minhas irmãs também já viveram aqui, mas
hoje estão em Atibaia. Minha mãe
vive no Japão", afirma. Ao lado da
construção, eles mantêm uma loja de artigos para viagem. "Os
sem-teto estão usando a água da
minha loja", reclamou.
Questionado sobre as condições
do edifício, aparentemente abandonado (sujo e com a pintura desgastada), Sznifer diz: "A estrutura
ainda está boa, foi feita para
aguentar até 12 andares, mas tem
muita barata e muito rato".
Tarefas
Grávida de quase seis meses, a
operadora de telemarketing Ana
Maria Tudéia Mendes, 29, era
uma das 500 pessoas que participaram da invasão do edifício da
rua Aurora. Ela tem outros dois filhos, de 8 e 6 anos, e morava em
uma pensão no centro, ao lado do
marido, que sustenta a família
com um salário mínimo -dinheiro suficiente só para pagar o
aluguel. Ela está desempregada e
disse que não teve outra opção.
Na ocupação, todos têm de contribuir para cuidar do imóvel. As
divisões de tarefas incluem turnos
de vigilância na porta de entrada,
limpeza, cozinha e o cuidado das
crianças. As participações nas tarefas funcionam como uma contagem de pontos para a escolha
dos beneficiários em caso de o
imóvel vir a ser dividido entre os
ocupantes. Como há mais invasor
que moradias, quem participa
mais tem mais chance de ter sua
casa primeiro.
No hotel Danúbio, a preocupação é com os móveis que estão no
prédio. Hamilton Sílvio de Souza,
42, um dos coordenadores do
MSTRC (Movimento Sem-Teto
da Região Central), afirmou que
no edifício ainda há camas, televisões, sofás e edredons que pertenciam ao hotel. "Queremos ter cuidado para que não suma nada."
Os sem-teto também encontraram móveis no prédio do antigo
hotel Terminus, na avenida Ipiranga. "Já havia cama e colchão
por aqui", afirmou Ednalva Franco, 30, que só reclamava da falta
de luz e de água. O clima ontem
era de tensão no edifício, por conta das ameaças de PMs de retirar
os invasores. "A ordem é resistir
até a morte. Os PMs já me agrediram durante a madrugada", disse.
(ALENCAR IZIDORO E CHICO DE GOIS)
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