São Paulo, Quinta-feira, 22 de Julho de 1999
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INCULTA & BELA

"Faz um 21"

PASQUALE CIPRO NETO
Colunista da Folha

É claro que não vou meter minha colher na questão da telefonia. Eles que se entendam. E que façam a coisa funcionar, pelo amor de Deus! Quero discutir a forma verbal "faz", do bordão publicitário de uma das "prestadoras". Nos bancos escolares, aprendemos a conjugação e o emprego dos verbos no modo imperativo -aquele que se usa para ordenar, pedir, suplicar, rogar. O bom professor, no caso, é aquele que consegue mostrar que o imperativo abonado pela norma culta se impõe naturalmente em certas situações. Ninguém escreveria numa sala pública algo como "Não fuma". No entanto, em muitas regiões do país -São Paulo, por exemplo-, é essa a forma empregada no dia-a-dia, em situações informais. O que se fala nem sempre se escreve, o que não é nenhuma novidade. Não é preciso repetir que em língua o que vale é a adequação. "Faz um 21", diz a bela Ana Paula Arósio. Como imperativo afirmativo, "faz" não é comum na Bahia, por exemplo. No dia-a-dia, é mais comum que os baianos digam "faça", sem o tom mais ou menos autoritário ou formal que costuma ter em São Paulo. E o que diz a gramática padrão? Diz que o imperativo afirmativo da segunda pessoa do singular (tu) é formado a partir do presente do indicativo, sem o "s" final. Então "tu fazes" ("eu faço, tu fazes..."), sem o "s", resulta em "faze". Já pensaram em Ana Paula dizendo "Faze um 21"? A ortodoxa forma "faze" já virou "faz". Até a Fuvest a adotou numa questão do concurso de 97, baseada neste trecho: "Conta Rubem Braga o conselho que um amigo lhe deu certa vez: "Olhe, Rubem, faça como eu, não tope parada com a gramática'". A Fuvest pedia ao candidato que supusesse o amigo tratando Rubem por tu. A resposta dava como correta a forma "faz", em vez de "faze", igualmente correta ("Olha, Rubem, faz como eu..."). No caso da propaganda estrelada por Ana Paula Arósio, não vale a pena topar parada com a gramática. O texto todo é posto na terceira pessoa (você), mas o recado final é dado na segunda (tu): "Faz um 21". Em situações formais, persegue-se e deseja-se a chamada "uniformidade de tratamento". Não parece ser esse o caso da linguagem publicitária, muitas vezes próxima da coloquial. O único problema é que, como vimos, a forma escolhida não é unanimidade na língua oral dos brasileiros. É isso.



Pasquale Cipro Neto escreve nesta coluna às quintas-feiras.
E-mail: inculta@uol.com.br




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