São Paulo, domingo, 22 de agosto de 2004

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Mimar pode ser mecanismo de projeção

Eduardo Knapp/Folha Imagem
Joice Cavalcante com a sua cadela, Miss, após o animal receber tratamento estético nas orelhas


DA REPORTAGEM LOCAL

O que leva um adulto a tratar seu animal de estimação com pompa e luxo? Dois estudiosos do comportamento humano ouvidos pela Folha buscam na psicologia a explicação para o crescimento deste fenômeno.
Para o psicanalista Jacob Pinheiro Goldberg, doutor em psicologia pela Universidade Mackenzie, o consumo de bens de luxo para usufruto de cachorros faz parte de um mecanismo de projeção. "Os donos depositam sobre os cãezinhos carências que são deles próprios", diz.
Ele acredita que essa mudança de comportamento já vem ocorrendo há décadas, desde que aumentou a inserção dos animais de estimação dentro de apartamentos nas grandes cidades.
"O brasileiro vem seguindo o modelo norte-americano que transforma o animal em um bibelô. Com a maior proximidade física, aumenta a intimidade e os donos passam a dar ao cachorro condutas que são tradicionalmente humanas."
O fato de os animais ganharem nomes de pessoas é um sinal dessa nova relação, acredita o psicanalista. Em seu consultório, ele já viu adultos comentarem que seus cães adotaram comportamentos de ansiedade e histeria. Geralmente, era o mesmo diagnóstico que ele detectara nos pacientes.
Geraldo José de Paiva, professor de psicologia social da USP, aponta que sempre existiram comportamentos semelhantes na história da humanidade. Cita como exemplo os banquetes da Grécia antiga, que podiam durar dias -enquanto a maior parte da população morria de fome.
"É tudo uma questão de consciência do horizonte. Há pessoas que vivem dentro dos limites de seu mundo. O que está fora é como se não existisse. O que é supérfluo para alguns parece um gasto natural e até necessário para outros", afirma.
Para Goldberg, os gastos de alto luxo dos cachorros tem a intenção de colocá-lo numa "vitrine social". "É uma substituição do que faziam com seus filhos anos atrás, já que os adolescentes de hoje se identificam mais com ícones ligados à classe média e baixa, como os rappers", teoriza.
A mulher dele, a socióloga Norma, tem um poodle toy em casa. "Mas eu nem chego muito perto. Eu gosto de cachorro na rua", afirma o psicanalista. (FS)


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