São Paulo, Sexta-feira, 22 de Outubro de 1999
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GUERRA URBANA

Cinco de sete colégios de Heliópolis alteraram horário depois que circulação foi proibida após as 21h

Tráfico decreta toque de recolher e faz escolas de SP dispensar seus alunos

ALESSANDRO SILVA
da Reportagem Local

Grupos rivais que disputam pontos de tráfico de drogas impuseram o toque de recolher na favela Heliópolis -a maior de São Paulo. Desde a última segunda-feira, segundo os moradores, as ruas precisam estar vazias às 21h.
O novo limite de horário atingiu em cheio as escolas que funcionam ao redor de Heliópolis. Cinco dos sete colégios mais próximos da favela alteraram o horário das aulas noturnas e estão dispensando os alunos mais cedo.
Em um deles, a Escola Municipal Luiz Gonzaga, cuja quadra de esportes fica ao lado da favela, as aulas diurnas de educação física também foram suspensas. ""O que mais se estranha é que os alunos nem estão pedindo para fazer esportes, como é de costume", disse uma das professoras.
Esta semana, a aulas no colégio não passaram das 21h, segundo funcionários ouvidos.
A mudança de horários foi implantada a pedido de pais e alunos, segundo professores e funcionários das escolas que não querem ser identificados.
Conforme moradores, "soldados" do tráfico passaram nas casas alertando para a possibilidade de confronto entre os grupos rivais e aconselhando que ninguém ficasse na rua após as 21h.
""Eles deram a ordem: quem tiver na rua leva tiro também", disse o estudante E., 16.
Um alerta semelhante havia sido dado na semana passada. No dia seguinte, um grupo em uma perua Kombi percorreu ruas do bairro e matou seis pessoas. Foi o começo da disputa.
Nos últimos dois dias, começaram também os telefonemas ameaçadores, que ordenam o fechamento imediato das escolas, sob risco de invasão, tiroteio e mortes. ""Na dúvida, se os telefonemas são trote ou não, pela segurança deles, terminamos a aula mais cedo", disse uma diretora.
Três colégios estaduais e um municipal liberaram seus estudantes antes das 22h30 anteontem. Uma quinta escola fechou antes das 20h, por causa de uma ligação anônima, mas a informação não foi confirmada.
Diretores e professores, que preferem não ter os nomes revelados, disseram que as aulas perdidas deverão ser repostas.
As histórias sobre o que está ocorrendo dentro de Heliópolis são contadas pelos estudantes.
Com as ruas vazias, os traficantes controlam a aproximação de pessoas estranhas. ""Tem lugar, lá no meio, que ninguém entra depois das 20h30", afirmou o ajudante geral F., 24.
Professores disseram que é o medo está fazendo com que alguns alunos se distanciem das aulas. Essa é a situação do garoto C.,17, que mora na favela e estuda à noite até sexta-feira. ""Prefiro ficar em casa."

Insegurança
A sensação de insegurança aumenta com os incidentes que antecederam a chacina e a divulgação do toque de recolher. Na escola estadual Ataliba de Oliveira, por exemplo, no início do mês, o vitrô da porta principal foi atingido por um tiro de revólver.
Tanto as polícias como as secretarias da Educação e da Segurança Pública informaram ontem desconhecer o toque de recolher.
""Há pelo menos três lideranças do tráfico lá dentro", disse o delegado Edmundo de Lacerda Neto, do 95º DP (Heliópolis), que não descarta a briga entre quadrilhas. Segundo a polícia, os moradores da favela dificilmente fornecem informações.


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