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ASFALTO SELVAGEM
Para especialistas, resultado da pesquisa com motoristas paulistanos indica o efeito do estresse urbano
Invasão de espaço irrita mais que risco à vida
DA REPORTAGEM LOCAL
Os motoristas costumam se irritar mais por ter seu espaço invadido, numa disputa de poder com
os demais veículos, do que com
situações que representem real
ameaça à vida. A opinião é de especialistas ouvidos pela Folha,
para os quais os resultados da
pesquisa com 500 condutores reforçam essa constatação.
As principais causas de mortes
no trânsito no país estão ligadas
ao excesso de velocidade, à embriaguez dos motoristas ou a infrações graves como ultrapassagem no semáforo vermelho.
Esses aspectos perdem espaço
na irritação dos motoristas, porém, para reclamações como "ter
vaga roubada no estacionamento" ou contra veículos que andam
muito devagar. Ao mesmo tempo, 29% dizem ignorar os limites
de velocidade da via e 18% admitem dirigir, ao menos "ocasionalmente", mesmo tendo ingerido
álcool acima do permitido.
"As pessoas se incomodam porque tiveram seu espaço invadido,
não por estarem ameaçadas. É resultado do estresse urbano. Não é
comportamento de mau motorista, mas de mau cidadão", diz Horácio Augusto Figueira, especialista em engenharia de tráfego.
"Cada um se sente juiz do outro,
mas nunca vê seu próprio erro.
Todos querem justiça com as próprias mãos, agir com fúria para
ganhar espaço. Não é para chegar
mais rápido", afirma José Montal,
da Abramet (Associação Brasileira de Medicina de Tráfego).
No ranking de reclamações dos
motoristas, 86% se irritam quando se deparam com um veículo
que está muito devagar, índice
maior de irritação do que quando
alguém está bem acima do limite
de velocidade (55,2%).
Reciclagem
A médica Fabiane Amorim de
Lima, 31, passou todas as noites
desta semana na sede do Detran
de São Paulo. Teve que assistir a
um curso que tem o sugestivo nome de Reciclagem de Infratores.
Se passar na prova final, consegue
de volta sua habilitação.
Foram duas multas por excesso
de velocidade, duas por falar ao
celular enquanto dirigia, uma por
ignorar o sinal vermelho e outra
por não respeitar o rodízio. Tudo
isso lhe custou ao menos R$ 3.000
e a suspensão da carteira.
Mesmo com o prejuízo e com as
cinco noites perdidas no Detran,
Fabiana explica que a partir de
agora só vai ficar mais cautelosa
em relação à velocidade. Diz que
não planeja deixar de falar ao celular nem de passar em sinal vermelho. "Minha mãe já foi assaltada três vezes em cruzamentos.
Não me sinto nem um pouco confortável de parar num sinal vermelho à noite. Quanto ao celular,
é minha ferramenta de trabalho."
Ontem, ela dizia a um colega
também sem carteira que não se
sentia como uma transgressora.
"Todo mundo comete alguma infração. Eu só não sou tão esperta
quanto os outros motoristas."
(ALENCAR IZIDORO, RICARDO WESTIN E FABIO SCHIVARTCHE)
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