São Paulo, sexta-feira, 22 de outubro de 2004

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ASFALTO SELVAGEM

Para especialistas, resultado da pesquisa com motoristas paulistanos indica o efeito do estresse urbano

Invasão de espaço irrita mais que risco à vida

DA REPORTAGEM LOCAL

Os motoristas costumam se irritar mais por ter seu espaço invadido, numa disputa de poder com os demais veículos, do que com situações que representem real ameaça à vida. A opinião é de especialistas ouvidos pela Folha, para os quais os resultados da pesquisa com 500 condutores reforçam essa constatação.
As principais causas de mortes no trânsito no país estão ligadas ao excesso de velocidade, à embriaguez dos motoristas ou a infrações graves como ultrapassagem no semáforo vermelho.
Esses aspectos perdem espaço na irritação dos motoristas, porém, para reclamações como "ter vaga roubada no estacionamento" ou contra veículos que andam muito devagar. Ao mesmo tempo, 29% dizem ignorar os limites de velocidade da via e 18% admitem dirigir, ao menos "ocasionalmente", mesmo tendo ingerido álcool acima do permitido.
"As pessoas se incomodam porque tiveram seu espaço invadido, não por estarem ameaçadas. É resultado do estresse urbano. Não é comportamento de mau motorista, mas de mau cidadão", diz Horácio Augusto Figueira, especialista em engenharia de tráfego.
"Cada um se sente juiz do outro, mas nunca vê seu próprio erro. Todos querem justiça com as próprias mãos, agir com fúria para ganhar espaço. Não é para chegar mais rápido", afirma José Montal, da Abramet (Associação Brasileira de Medicina de Tráfego).
No ranking de reclamações dos motoristas, 86% se irritam quando se deparam com um veículo que está muito devagar, índice maior de irritação do que quando alguém está bem acima do limite de velocidade (55,2%).

Reciclagem
A médica Fabiane Amorim de Lima, 31, passou todas as noites desta semana na sede do Detran de São Paulo. Teve que assistir a um curso que tem o sugestivo nome de Reciclagem de Infratores. Se passar na prova final, consegue de volta sua habilitação.
Foram duas multas por excesso de velocidade, duas por falar ao celular enquanto dirigia, uma por ignorar o sinal vermelho e outra por não respeitar o rodízio. Tudo isso lhe custou ao menos R$ 3.000 e a suspensão da carteira.
Mesmo com o prejuízo e com as cinco noites perdidas no Detran, Fabiana explica que a partir de agora só vai ficar mais cautelosa em relação à velocidade. Diz que não planeja deixar de falar ao celular nem de passar em sinal vermelho. "Minha mãe já foi assaltada três vezes em cruzamentos. Não me sinto nem um pouco confortável de parar num sinal vermelho à noite. Quanto ao celular, é minha ferramenta de trabalho."
Ontem, ela dizia a um colega também sem carteira que não se sentia como uma transgressora. "Todo mundo comete alguma infração. Eu só não sou tão esperta quanto os outros motoristas." (ALENCAR IZIDORO, RICARDO WESTIN E FABIO SCHIVARTCHE)


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