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MOACYR SCLIAR
A bolsa cai, mas dá lucro
Três mulheres assaltaram uma loja
da marca Victor Hugo no centro de
Campo Grande (MS) e levaram 12
bolsas. Cotidiano, 18.fev.2004
Bolsa se recupera depois de quedas.
Dinheiro, 18.fev.2004
As três eram pessoas de
classe média. As três tinham
modestas posses mas as três eram
ambiciosas, e sonhavam com a
prosperidade: apartamentos luxuosos, carrões, jóias, vestidos caros. Precisavam de dinheiro, portanto, dinheiro que não poderiam esperar de um marido (duas
eram solteiras, uma terceira divorciada). Pergunta: como arranjar uma grana, a curto prazo?
Tentaram várias loterias, sem
êxito. Apostaram numa alta do
dólar, e também se deram mal. E
aí pensaram na Bolsa.
Que vinha subindo, e já era considerada como o melhor investimento no país. Mas as três não tinham muita sorte. Tão logo fizeram as aplicações, as ações tiveram quedas violentas e elas perderam dinheiro.
Contudo, a aventura lhes deu
uma idéia, a idéia das bolsas. Este
é um acessório extremamente valorizado na moda. Uma bolsa de
grife, disso sabiam, pode valer
R$ 3.000 ou R$ 4.000. Vender bolsas seria um negócio lucrativo. O
problema é que elas não tinham
bolsas. Nem dinheiro para comprar bolsas. Depois de discutir
muito chegaram à conclusão de
que a única forma de conseguir
bolsas seria roubá-las.
Um procedimento arriscado,
mas exequível: questão de técnica. Não usariam violência, a menos que fosse necessário. Nada de
revólveres, nada de metralhadoras, armas que aliás nem sabiam
usar. No máximo um canivete,
para ser usado em último caso.
Quanto à técnica, dependeria de
um detalhe fundamental: precisavam esconder bem o produto
do furto. Decidiram usar saias
longas e esconder sob elas as bolsas. Ninguém, nem mesmo uma
vendedora, se atreveria a pedir
que erguessem a saia. O espaço
delimitado pela saia de uma mulher é um espaço secreto; e o segredo é essencial tanto para a moralidade, como para os negócios.
Treinaram bastante, e aprenderam a segurar bolsas (baratas,
mas a manobra valeria para as
caras) entre as pernas. Não era
difícil. Caminhavam de maneira
um pouco rígida, como se fossem
top models, mas isso era até adequado para a encenação.
E aí partiram para a empreitada. Que poderia ter dado certo,
não fosse o problema com uma
bolsa, justamente aquela que tinham valorizado mais. Quando
já estavam de saída, a maldita
caiu de entre as pernas de
uma das mulheres. Seriam frustradas, mais uma vez, pela queda
da Bolsa?
Não. Aí entrou em jogo o canivete: a vendedora foi informada
de que se tratava de um assalto, e
se comportou de acordo, deixando que as três saíssem com suas
bolsas. E elas se foram, convencidas de que a violência é apenas a
continuação da especulação por
outros meios.
Moacyr Scliar escreve às segundas-feiras, nesta coluna, um texto de ficção
baseado em reportagens publicadas no
jornal.
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