São Paulo, segunda, 23 de fevereiro de 1998

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Estrondo ouvido à 0h30 fez os moradores deixarem apartamentos antes da queda

Uma das vítimas voltou ao prédio para pegar a fantasia que usaria à noite

Edifício, feito por contrutora do deputado Sérgio Naya, não possuía habite-se, tinha rachaduras e infiltrações
Prédio de 22 andares cai no Rio e soterra 4

Ana Carolina/Folha Imagem
Escombros do prédio de 22 andares que desabou ontem de madrugada na Barra da Tijuca, no Rio


WILSON TOSTA
FELIPE WERNECK
da Sucursal do Rio

Um prédio de 22 andares e 44 apartamentos desabou na madrugada de ontem na Barra da Tijuca, zona sul do Rio. Quatro pessoas ficaram sob os escombros. Os bombeiros acreditam que estejam mortas. Há informação de que outras quatro -um casal e duas crianças- possam também estar soterradas
O prédio, feito pela construtora Sersan, do deputado federal Sérgio Naya (PPB-MG), já era objeto de processos judiciais por suposta má qualidade na construção, não recebera da Prefeitura do Rio o "habite-se" (autorização de ocupação) e tinha rachaduras e infiltrações.
O desabamento levou para o chão todos os apartamentos das colunas 1 e 2 do bloco 2 do condomínio Palace, na rua Jornalista Henrique Cordeiro, 350, e aconteceu às 4h25. Também caiu parte dos apartamentos 3 e 4. Antes do desastre, muita gente saiu do edifício, por iniciativa de moradores e por ordem dos bombeiros e da Defesa Civil Municipal.
Após o desmoronamento, os bombeiros não chegaram a remover nenhuma das lajes que desabaram. Às 10h15, suspenderam as buscas, por temer novos desabamentos. Segundo o presidente da Fundação Geo-Rio, Moysés Vibranowsky, alguns pilares, em consequência do desabamento, ficaram seccionados, e os escombros passaram a escorar o restante do edifício, ainda de pé.
"Vamos ter que fazer um trabalho de escoramento que vai levar três ou quatro dias", disse ele. "Só após isso os bombeiros terão segurança para trabalhar."
O chefe da Defesa Civil Municipal, coronel Nilton Barros, disse que a "causa primária" do desabamento foi o rompimento de um pilar no segundo subsolo, onde ficava a segunda garagem. A constatação de que a peça estava "flambada" (inchada para os lados, dando a impressão de que ia estourar) levou moradores a abandonar o prédio.
"O Gerard (engenheiro que morava no prédio e está sob os escombros) viu a pilastra e falou: 'Com pilar não se brinca, tem que interditar e desocupar o prédio agora.' E começamos a sair", afirmou o tenente-coronel bombeiro Marcos Silva, comandante do Grupamento de Socorro Florestal e Meio Ambiente e morador do edifício, que comandou a primeira fase da desocupação.
O primeiro abalo aconteceu à 0h30. Um barulho, semelhante a um estrondo, foi ouvido por moradores do condomínio e de prédios vizinhos.
"As camas pularam", contou Rosana Neves, moradora do 1.507 do bloco 2. Chamado em seu apartamento, o tenente-coronel Silva pediu ajuda ao Grupamento de Busca e Salvamento da Barra da Tijuca e desceu com Gerard e outros moradores até a segunda garagem, onde viram o problema.
Segundo Barros, os moradores soterrados -além de Gerard, Leonel Benevides, Gilberto Maneschy e Fátima Barbosa Ferraz- voltaram aos apartamentos burlando a vigilância da Defesa Civil e dos bombeiros, que já tinham interditado o prédio. Fátima havia ido pegar as fantasias que usaria no desfile da Caprichosos de Pilares e da Unidos da Tijuca.
A advogada Nerina Leão, 40, chegou ao local à tarde. Ela disse que a família do ex-cunhado Nilton Luís Martins pode estar sob os escombros.
Além de Martins, estariam no prédio na hora do acidente sua mulher, Rosângela Quaresma, e os filhos Luísa de Alencar Leão Martins, 13, e Nilton Martins Neto, 3. O carro de Martins, um Gol verde, não estava na garagem.
Os bombeiros afirmam não ter informações sobre o sumiço da família. Rui Feital, da comissão de moradores, afirmou que todo mundo saiu do prédio quando o alerta foi dado. Alguns moradores acusaram a Defesa Civil de, inicialmente, não ter sido clara quanto ao perigo imediato de desabamento.
"Eles vieram, vistoriaram e disseram que o edifício ia cair, mas não hoje", disse Rodrigo de Brito Silveira, morador do bloco 1.
O chefe da Defesa Civil Municipal disse não ter mais esperanças de encontrar sobreviventes sob as toneladas de escombros, que formaram uma pilha de cerca de 20 metros de altura.
"Seria uma feliz surpresa se encontrássemos alguém vivo", afirmou Barros. Segundo ele, o resgate a ser feito é "artesanal e delicado", por causa do perigo de novos desabamentos.




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