São Paulo, sábado, 23 de abril de 2005

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INFÂNCIA

Entidades acusam a Polícia Militar de fazer ação "higienista" contra jovens; operações são consideradas inócuas

PM ignora lei e retira crianças das ruas de SP

FERNANDA MENA
DA REPORTAGEM LOCAL

A Polícia Militar tem retirado compulsoriamente, do centro de São Paulo, meninas e meninos de rua, o que contraria o Estatuto da Criança e do Adolescente.
O ECA determina que nenhum adolescente pode ser recolhido pela polícia a não ser que esteja cometendo algum ato infracional (art. 106). No entanto, desde a "Operação Limpa", deflagrada pela prefeitura no centro da cidade em março, foi intensificado o encaminhamento de meninos e meninas de rua para abrigos pela PM, segundo entidades sociais e de direitos humanos. A prefeitura prepara, para a próxima semana, nova etapa da "Operação Limpa" em que a área de atuação da polícia, da Subprefeitura da Sé e da Secretaria de Desenvolvimento e Assistência Social será ampliada.
Dados do projeto Criança Cidadã, entidade que recebe esses jovens desabrigados e mantém parceria com o Estado de São Paulo, confirmam o aumento. Em fevereiro deste ano, 373 crianças e jovens de rua foram encaminhados ao projeto. Em março, esse número subiu para 800. E, apenas nos 14 primeiros dias de abril, a entidade já somava 374 meninos e meninas de rua encaminhados.
Além de ilegal, a medida é inócua, já que, pouco depois de retirados do centro, os mesmos jovens estão de volta às ruas. O acolhimento e encaminhamento de crianças e jovens de rua deveriam ser feitos por educadores e assistentes sociais da prefeitura.
ONGs que atuam na área da infância protocolaram uma representação no Ministério Público Estadual no qual acusam a Polícia Militar do governo Geraldo Alckmin e a administração José Serra, ambos do PSDB, de adotar uma política "higienista" para o jovem em situação de rua.
A Polícia Militar nega que esteja coagindo jovens de rua a ir para abrigos. A reportagem da Folha, no entanto, flagrou na tarde do dia 13 de abril policiais colocando três garotos no carro da PM. Questionados, informaram que os levariam para um abrigo.
"Há uma determinação de que a polícia retire essa molecada do centro", afirmou um PM, que pediu anonimato. "Vamos fazer isso até que alguém resolva cuidar de verdade do problema", completou. "Estamos enxugando gelo."
Um garoto de 12 anos que a reportagem encontrou no Criança Cidadã disse já ter sido levado para lá "mais de 15 vezes".
"O problema dessas crianças e jovens é mais complexo. Uma ação como essa da polícia tem apelo para a sociedade, mas não resolve nada", diz Lúcia Pinheiro, coordenadora-geral do Projeto Travessia, que atua há dez anos com crianças nas ruas do centro.
"O objetivo tem de ser proteger as crianças e jovens, e não retirá-los de bairros nobres", diz o promotor de Defesa da Infância e da Juventude, Vidal Serrano.
"O efeito polícia não é bom", confirma Roma di Mônaco, diretora do Criança Cidadã. "Não é um programa emergencial que vai resolver esse problema", diz.


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