São Paulo, quinta, 23 de abril de 1998

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OPINIÃO
A Sabesp e as eleições

NIVALDO SANTANA

O governador Mário Covas, candidato à reeleição, está de olho em R$ 2 bilhões para continuar sua peregrinação pelo Estado, inaugurar obras com visibilidade eleitoral e dar a impressão de que seu governo é empreendedor.
Esses R$ 2 bilhões virão da pretendida venda de 20% das ações da Sabesp para um grupo privado -ou um "parceiro estratégico", como o governo prefere chamar- até 10 de julho.
A venda de ações e a transferência da gestão para um sócio privado podem trazer vários problemas. Por falta de rentabilidade, é bem provável que não haja interesse na manutenção e na expansão do setor às áreas mais carentes. Tampouco o dinheiro obtido pelo Estado com a venda das ações será investido em saneamento.
Só isso já seria suficiente para que o governo não se precipitasse em vender parte de uma empresa lucrativa. Principalmente porque a Sabesp não depende do tal parceiro para ser eficiente. Em 97, a empresa obteve um lucro de R$ 576 milhões. A rentabilidade da empresa passou de -2,82% em 94 para 5,66% em 97, o que a transformou em uma das cinco empresas mais lucrativas do país.
Nos últimos três anos, a Sabesp conseguiu mais de 2 milhões de novos consumidores. A companhia atende a 24 milhões de pessoas em 7 milhões de domicílios. Dos 645 municípios de São Paulo, a estatal abastece 358.
O modelo proposto por Covas é uma tentativa de driblar a legislação, uma vez que são os municípios que detêm o poder concedente na área de saneamento básico. O Estado está impedido de repassar o controle acionário para os grandes especuladores que vêm arrematando os serviços públicos.
O escândalo do negócio salta à vista: Covas pretende vender 20% das ações ordinárias da empresa e conceder ao parceiro estratégico, no mínimo, três dos nove membros do conselho de administração e três das oito diretorias.
Segundo orientação das consultorias contratadas (Bozano, Simonsen e Santander), os detentores de só 20% das ações teriam direito às importantes diretorias econômico-financeiras, de distribuição e de produção de água na região metropolitana. Mais: o sócio estratégico terá poder de veto e dividendos mínimos garantidos.
Especialistas apontam outro caminho para universalizar o saneamento, com tarifas socialmente justas. A meta da Sabesp não é dividir o lucro entre os acionistas, e sim investir o que arrecada para melhor atender à população.
Como a preocupação social não é prioridade da iniciativa privada, tudo indica que o sócio vai operar os serviços mais lucrativos, garantindo os seus bônus. O ônus, como sempre, fica para o usuário, que, além dos serviços degradados, enfrentará tarifas mais pesadas, das quais sairá o lucro dos acionistas.
Os problemas no Rio são bom exemplo do que significa a privatização de serviços públicos essenciais. Sem falar em países como a Argentina, que, ao privatizar o saneamento, tornou-o um martírio para a população. O "sócio estratégico" de lá é o mesmo que está de olho na Sabesp e, provavelmente, garantirá cofres cheios para obras eleitoreiras do governador.


Nivaldo Santana, 44, é deputado estadual, líder do PC do B na Assembléia Legislativa e ex-presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente do Estado



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