São Paulo, quarta-feira, 24 de janeiro de 2001

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URBANIDADE

Fora dos trilhos

GILBERTO DIMENSTEIN
DO CONSELHO EDITORIAL

Num dos maiores negócios imobiliários da história de São Paulo, o governo federal está decidido a leiloar áreas em torno da linha de trem que corta a cidade -os terrenos pertencem à Rede Ferroviária Federal S/A (RFFSA).
Para reforçar o caixa, o Ministério dos Transportes ameaça um dos projetos mais sonhados por urbanistas para melhorar a qualidade de vida na cidade: repovoar a orla ferroviária. Isso seria feito por meio de parceria entre os governos federal, estadual e municipal e a iniciativa privada.
São 135 quilômetros de trilhos, cruzando áreas abandonadas ou subvalorizadas da cidade, onde no passado prosperaram indústrias. Galpões vazios apodrecem inúteis. Ao redor das indústrias surgiram bairros populares, como Brás e Mooca, que atraíram milhões de imigrantes e migrantes.
"Estamos diante de uma loucura", afirmou ontem o secretário estadual dos Transportes Metropolitanos, Cláudio de Senna Frederico, disposto a liderar uma campanha para sensibilizar os paulistanos em geral e, em particular, os políticos e governantes.
A loucura, na opinião do secretário, é deixar de aproveitar as áreas que acompanham o trilho -quase três vezes o tamanho de Santos- para construir casas, estabelecimentos comerciais, escolas e parques, o que evitaria que a cidade se espraiasse ainda mais e que a periferia se ampliasse.
A idéia é internalizar o crescimento, aproveitando a infra-estrutura já construída e beneficiada pela linha do trem a ser conectada com o metrô. "É a grande chance de desenvolver um projeto viável, democratizando o espaço da cidade", afirma a urbanista Raquel Rolnik.
Os urbanistas apostam na reurbanização da orla como uma nova fronteira a ser desbravada -um pálido sinal do que esse desbravamento significaria é visível no Centro Empresarial da Água Branca, ao lado do trilho.
O governo federal está empenhado em levantar recursos com os leilões, mas pouco ou nada interessado em investir em projetos de revitalização urbana.
O governo estadual não se articulou politicamente para pressionar o Ministério dos Transportes e impedir os leilões e, enfim, a prefeitura de Marta Suplicy, metida no atoleiro fiscal, ainda não está informada sobre as negociações com a RFFSA. É um sonho urbano, por enquanto, fora dos trilhos.

E-mail: gdimen@uol.com.br




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