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São Paulo, quinta-feira, 24 de abril de 2003

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Garotinho aposta futuro político em ato extremo

MARCELO BERABA
DIRETOR DA SUCURSAL DO RIO

A nomeação do ex-governador Anthony Garotinho (PSB) para a Secretaria de Segurança Pública do Rio de Janeiro é uma medida extrema para salvar o governo de sua mulher, Rosinha Matheus.
A decisão tem o objetivo claro de tentar demonstrar publicamente a vontade política do governo fluminense de inverter o quadro de descontrole na área de segurança. Mas é uma incógnita para o próprio governo o efeito da manobra.
O agravamento da crise de segurança ocorre simultaneamente a duas outras crises: uma, de origem política, provocada pelas denúncias de corrupção na Secretaria de Fazenda durante a gestão do ex-governador (1999 a abril de 2002); a outra, de natureza econômica, com o Estado sem recursos para pagar suas dívidas e sem fôlego para investimentos.
A combinação desses três fatores praticamente paralisou a administração estadual. O desgaste da governadora ficou constatado na pesquisa Datafolha realizada no início de abril: 36% da população considerou sua gestão ruim ou péssima, contra 22% que a consideraram boa ou ótima.
Soma-se a esse quadro extremamente adverso um enfrentamento permanente do casal com o governo Lula. Ao chamar para si a responsabilidade de gerir a política de segurança, Garotinho tenta afastar de vez o fantasma de uma intervenção formal ou branca do governo federal no Rio.
Há um consenso hoje de que as grandes cidades brasileiras não conseguirão enfrentar as ações cada vez mais ousadas dos bandos do narcotráfico e do crime organizado apenas com as forças estaduais. O entrosamento entre as várias polícias e a disponibilização de recursos federais são condições indispensáveis para um trabalho produtivo.
O modelo de cooperação que está sendo testado pelo governo federal no Espírito Santo -que deve se estender em breve para outros Estados- estava inviabilizado no Rio por causa das incompatibilidades entre as figuras-chaves desse processo, Luiz Eduardo Soares, secretário Nacional de Segurança Pública, em Brasília, e Josias Quintal, no Rio.
Os dois trabalharam juntos no governo Garotinho na área de segurança e se tornaram inimigos a partir de março de 2000, quando Soares foi demitido pelo então governador. O ex-assessor havia denunciado a existência de uma "banda podre" na polícia fluminense.
A nomeação de Garotinho contraria a lógica de que o governo estadual deveria procurar um nome de sua confiança, mas de trânsito fácil no governo federal. O novo secretário não ajuda a desobstruir os canais entre o Planalto e o Guanabara. Além do conflito com Luiz Eduardo, Garotinho tem uma candidatura presidencial colocada para a sucessão de Lula. A discussão sobre política de segurança continuará fatalmente contaminada pelas diferenças partidárias e eleitorais.
Duas vezes prefeito de Campos (de 1989 a 1992 e de 1997 a 1998), governador do Rio de 1999 a 2002, candidato a presidente da República na última eleição e hoje o principal quadro do PSB nacional, Garotinho joga nessa indicação sua cartada mais arriscada. Está em jogo não apenas o futuro do governo de sua mulher, mas seu próprio projeto presidencial. Como definiu um de seus colaboradores próximos, é um jogo de tudo ou nada.


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