São Paulo, domingo, 24 de setembro de 2006

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Sem espaço, Justiça de SP improvisa arquivos

Juízes usam salas de audiência, gabinetes e até banheiros para abrigar os processos

Problemas ocorrem em comarcas como Santo André, Sumaré e São José do Rio Preto; há 15,3 milhões de ações em trâmite no Estado

REGIANE SOARES
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

O jeitinho brasileiro chegou ao Poder Judiciário de São Paulo. Sem ter onde colocar os processos que proliferam diariamente nos cartórios, juízes de várias comarcas transformaram seus gabinetes, salas de audiência e até mesmo banheiros em depósito de processos.
"Foi uma solução caseira", definiu o juiz André Gonçalves, diretor do Fórum de Sumaré (120 Km de SP), que guarda em seu banheiro privativo mais de 1.800 processos arquivados em mais de 70 caixas. O curioso é que o local continua sendo usado como banheiro, e é inclusive onde o juiz guarda sua toga e se troca para as audiências.
Para armazenar as caixas com os processos, foi instalada uma prateleira de dois metros de cumprimento por 30 centímetros de largura. Acima das tábuas, há três fileiras de caixas, uma sobre as outras.
O que parece ser apenas um improviso em Sumaré, é uma realidade em várias comarcas do Estado. Na de Santo André (Grande São Paulo), por exemplo, ações são guardadas no banheiro dos funcionários, localizado no subsolo do prédio.
Os processos ficam empilhados no chão ou em prateleiras, que só puderam ser instaladas no local porque empresários da região bancaram as despesas numa "vaquinha" organizada pela associação comercial.
O número de processos é tão grande em Santo André -são 160 mil apenas de execução fiscal- que a direção do fórum não sabe precisar quantos estão no banheiro. "Temos um sério problema de espaço, e não há mais para onde crescer", diz o juiz João Antunes dos Santos Neto, diretor do fórum.
Fóruns de cidades como Osasco, Arujá, Ibiúna e São Paulo (Lapa e Pinheiros) também montaram estruturas semelhantes em banheiros. Mas os arquivos-toilette estão temporariamente vazios porque recentemente os documentos foram levados para um arquivo central, em Jundiaí, - administrado pela empresa Recall do Brasil -onde estão guardados mais de 33,7 milhões de ações já julgadas.
"Isso aqui é como uma caixa-d'água: esvazia, enche e o excesso sai pelo ladrão. Daqui a pouco, vai ter processo saindo pelo ladrão novamente", explica o juiz Gonçalves.
A falta de espaço nos fóruns paulistas era previsível, pois a maioria dos prédios foi construída há mais de 50 anos com planta padrão. Ou seja, independentemente do número de habitantes ou de processos em cada comarca, o tamanho e a arquitetura não mudam.
Em todo o Estado são mais de 15,3 milhões de processos em tramitação e outros 45 mil dão entrada a cada em mês para apreciação de 1.600 juízes e 360 desembargadores. A média estadual é cerca de 20 mil processos por magistrado. Em países desenvolvidos, como a Alemanha, há cerca de 300 ações por magistrado.
O presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, Celso Luiz Limongi, acredita que o número de juízes por processo no Estado é pequeno, sobretudo se se levar em consideração a complexidade dos processos. Ele considera necessário criar juntas de conciliação e mediação e alterar os códigos de processo civil e penal para cortar "o abuso do direito de recorrer" de uma decisão. "Há muito recurso. Recorre-se de tudo."


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