São Paulo, quarta-feira, 24 de outubro de 2001

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VIOLÊNCIA

Filha de dois anos assistiu à agressão; caso é o 206º sequestro registrado este ano no Estado, em onda recorde de ocorrências

Casal é sequestrado e espancado por 12 h

Eduardo Knapp/Folha Imagem
Entrada de sítio na periferia de São Bernardo (Grande São Paulo) que serviu de cativeiro


SÍLVIA CORRÊA
DA REPORTAGEM LOCAL

Um casal de classe média foi sequestrado na noite de domingo quando chegava em casa em São Paulo. Reféns, marido e mulher foram espancados por cerca de 12 horas na frente da filha de dois anos. Voltaram para casa 24 horas depois, após um tiroteio que deixou dois mortos no cativeiro.
O caso é o retrato de uma preocupante estatística: a cada 34 horas uma pessoa é sequestrada no Estado de São Paulo. De janeiro até a tarde de ontem, 206 casos haviam sido registrados -12 ainda estão em andamento.
O número é recorde absoluto. Supera em 227% os crimes registrados em 2000 e bate a soma de todos os crimes desse tipo contabilizados desde 96 (veja quadro).
O governo alega que essa explosão representa uma migração de criminosos que antes agiam em áreas em que a polícia tem atuado com vigor. Para combatê-la, diz estar dobrando a capacidade da Divisão Anti-Sequestros.
A hipótese da migração encontra respaldo na opinião de pesquisadores da violência. Para eles, porém, se a polícia não erra no diagnóstico, erra na velocidade com que reage ao fenômeno, só reforçando a ação quando os casos chegam a picos escandalosos.

O caso 206
O advogado C.T.N., 51, a mulher e a filha chegavam em casa às 22h de domingo quando foram abordados por três homens. A família havia parado o carro (BMW) para entrar na garagem do prédio, numa rua sem saída do Campo Belo, bairro residencial da zona sul.
Seguiram todos -seis pessoas- na BMW até um supermercado próximo, onde o carro foi estacionado. Continuaram a viagem em uma Kombi até o cativeiro, um pequeno sítio na periferia de São Bernardo do Campo.
Até o meio da manhã, C. e a mulher foram surrados pelos sequestradores, que circulavam nus.
"Um deles chegou a trocar os tênis por uma espécie de coturno para que os chutes fossem mais fortes", narra o coronel José Roberto Marques, da Rota (Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar).
Para o coronel, a agressão visava intimidar o advogado, pois o grupo planejava soltá-lo de manhã para que ele fosse atrás do resgate -R$ 150 mil, "a quantia que poderia render a venda da BMW".
Foi a BMW, na opinião da polícia, que levou à escolha das vítimas. "Já é aleatório, a partir de qualquer sinal de riqueza exterior", diz o delegado Marcelo Dias, da Divisão Anti-Sequestro.
Solto por volta das 10h, C. foi orientado a buscar o carro, vendê-lo e esperar em casa um contato. Ele seguiu as recomendações, mas, como o contato não ocorreu até a noite, procurou a polícia.
Munidos com algumas descrições do local, oito PMs da Rota -à paisana- conseguiram localizar o cativeiro às 21h30. Havia quatro homens na casa.
"Os policiais decidiram invadir porque perceberam que haviam sido notados", diz o coronel da Rota. À invasão, segundo a polícia, os acusados reagiram a tiros. Dois morreram e dois fugiram.
Um dos mortos é Luís Fernando Barrocal, 24. O outro carregava documentos em nome de Cleiton Ferreira dos Santos, 20, procurado por uma dezena de sequestros.
A mulher do advogado disse à polícia que eles ameaçavam matá-la, pois estariam precisando da casa para manter outro refém.
Dos 49 cativeiros identificados neste ano, 90% são perto desse último, com fácil acesso pelas rodovias que seguem para o litoral.


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