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São Paulo, segunda-feira, 24 de novembro de 2003

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RIO

Risco de contaminação e sujeira não impediram que, ajudados até por PMs, 2.000 moradores de favelas levassem alimentos

Moradores saqueiam Ceasa após incêndio

PEDRO SOARES
DA SUCURSAL DO RIO

Cerca de 2.000 pessoas saquearam ontem alimentos e produtos de higiene e limpeza queimados, considerados impróprios para o uso, na sede da Ceasa (Centrais de Abastecimento do Estado do Rio de Janeiro S/ A) no Irajá (zona norte), atingida por um incêndio.
Moradores de favelas vizinhas -como Pára Pedro, Acari e Amarelinho- se amontoavam no meio dos escombros para conseguir levar para casa arroz, feijão, latas de óleo, sabonetes e até cerveja e chocolate.
Segundo o Corpo de Bombeiros, os saques começaram na madrugada de ontem, depois que o fogo foi controlado. O tenente-coronel Jorge Sampaio disse não ter sido possível impedir que as pessoas revirassem os destroços das 20 lojas queimadas. Bombeiros e policiais militares se limitaram a alertar os invasores sobre o risco de novos desabamentos.
Às 11h30, a área foi isolada e os saques, interrompidos. Três horas depois, um grupo voltou a pilhar produtos quando a retroescavadeira recolheu entulhos misturados com alimentos. A seguir, os PMs retiraram as pessoas.
Na busca, muitos acabaram feridos nos escombros, com pés e mãos cortadas ou arranhadas.
Mulheres (a maioria), homens, crianças e velhos tentavam carregar o que podiam. Nem o medo de contaminação os impediu de levar os produtos -muitos expostos ao tempo desde a véspera, como batata e leite. Até PMs ajudaram a carregar alimentos, na tentativa de liberar o local mais rapidamente.
Sem demonstrar preocupação com a sujeira e os riscos à saúde, as pessoas entravam nos destroços, vasculhando os espaços sob vigas e lajes destruídas pelo fogo. Ao saírem do meio do cimento e ferros retorcidos, estavam enegrecidas pela fuligem.
Mesmo assim, elas pareciam felizes. Quando conseguiam pegar uma boa quantidade de alimentos, gritavam frases como "É fome zero" e "É Natal sem fome", numa referência a programas de combate à carência alimentar.
Segundo comerciantes da Ceasa, o fogo teria começado na loja Doce Trigo, por volta das 13h15 de anteontem. O fogo rapidamente se propagou para outros boxes. A Ceasa tem 16 pavilhões, com uma média de 48 lojas cada um.
Ainda no sábado, depois que começou o incêndio, moradores de favelas vizinhas se aglomeraram em torno do pavilhão para tentar invadir o lugar. A presença PM e o medo do fogo, ainda não debelado, impediram a ação.
A Ceasa informou que existe um projeto para ampliar a segurança contra incêndios, orçado em R$ 1 milhão. Ele só deverá começar a ser implantado em 2004.

Histórico de saques
Tanto os incêndios como os saques têm sido comuns na Ceasa. Sem considerar as pequenas ocorrências de fogo, esse foi o quarto incêndio de grandes proporções no local desde 2001.
Em todos, uma rotina se repete: milhares de pessoas que moram em favelas vizinhas vão ao local para pegar alimentos.
A mais grave ocorrência dos últimos anos ocorreu em 2001. Em junho, 50 boxes ficaram destruídos. O último grande incêndio na Ceasa foi em janeiro passado e queimou 70 lojas, com prejuízo estimado em R$ 145 milhões.
Em 2002, outro incêndio, que destruiu 50 lojas, levou 3.000 pessoas à Ceasa com o objetivo de catar algo que tivesse escapado das chamas. Moradores e PMs, na época, entraram em confronto.


Colaborou MICHEL ALECRIM


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