São Paulo, quinta, 24 de dezembro de 1998

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SAÚDE
Uma ano após a entrada em vigor da lei de doação presumida, número de transplantes no país é igual aos de 1993
Não-doadores de órgãos passam de 60%

PRISCILA LAMBERT
da Reportagem Local

O número de pessoas que se declararam não-doadoras de órgãos neste ano ultrapassa os 60% em alguns Estados do país. É com esse alto índice de rejeição que a lei de doação presumida de órgãos completa um ano em vigor.
De acordo com o Instituto de Identificação Ricardo Gumbleton Daunt, de São Paulo, de 1.118.620 carteiras de identidade emitidas neste ano (incluídas as segundas vias), 693.518 (62%) são de não-doadores.
Também no Pará, o número de não-doadores chega a 70%. Na Bahia, a situação é mais complicada: pesquisa realizada em postos de atendimento dos dois maiores shopping centers de Salvador apontam que apenas 10% das carteiras emitidas são de doadores.
"É absolutamente preocupante", diz Walter Garcia, presidente da ABTO (Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos).
Segundo ele, as consequências devem aparecer a longo prazo. "Daqui há 10 ou 20 anos, quando essas pessoas começarem a morrer, não haverá doador", diz.
A lei de doação presumida de órgãos, em vigor desde 1º de janeiro, previa que todas as pessoas maiores de 21 anos que não se manifestassem contra a doação seriam automaticamente doadoras. A recusa deve constar no documento de identidade dos brasileiros.
Em outubro deste ano, após grande polêmica que envolveu a criação dessa lei, uma medida provisória mudou o conceito de "doação presumida" para "doação presumida fraca". Ou seja, se o cidadão declarar que não é doador, vale o que estiver no documento. Se ele não se manifestar, a família tem de ser consultada.
O Ministério da Saúde confirma que índices como esses são um problema para o sistema de transplantes do país. Mas, de acordo com Newton Wiederhecker, assessor da coordenação de alta complexidade do ministério, é possível reverter o quadro com campanhas de conscientização (leia abaixo).
O número de transplantes realizados no país permanece praticamente estável desde 93, com algum crescimento em determinados períodos e Estados, segundo a ABTO.
Em São Paulo, o aumento no número de transplantes neste ano em relação ao ano passado é atribuído à organização da captação de órgãos, que está sendo coordenada por uma central de transplantes. Há centrais em apenas oito Estados do país -e, em outros cinco, elas estão em fase de implantação. "Não é a lei dos transplantes que vai reverter o quadro de carência. É preciso haver organização e educação", diz Garcia.
O país realizou, de janeiro a setembro deste ano, 938 transplantes de rim com órgãos de doadores cadáveres. Para atender a demanda, seria necessária a realização de 9.000 transplantes renais por ano no país. Segundo a Central de Transplantes de São Paulo, um paciente chega a esperar, em média, seis anos e meio por um rim, 227 dias por um fígado e 290 dias por um coração.



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