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SP 450
Ricos e pobres estão insatisfeitos com áreas verdes
DA REPORTAGEM LOCAL
DA REDAÇÃO
O fato de o parque Ibirapuera
ser eleito, segundo pesquisa do
Datafolha, como maior ícone e local mais bonito da cidade de São
Paulo, famosa pela paisagem de
concreto dos arranha-céus, diz
muito sobre a importância que os
paulistanos dão às áreas verdes.
O resultado pode ser indicativo,
ainda, de uma carência quantificada em um estudo feito pelo
NEV/USP (Núcleo de Estudos da
Violência da Universidade de São
Paulo), em 2001 e 2003, com 700
moradores de diversos bairros da
capital e mais 346 pessoas que vivem em três distritos na periferia
da zona sul -Jardim Ângela, Jardim São Luís e Capão Redondo.
As conclusões da pesquisa, divulgadas com exclusividade para
a Folha, mostram que a porção de
paulistanos que se consideram
muito satisfeitos com a quantidade e a qualidade dos parques da
cidade caiu de 5% para 3% entre
2001 e 2003. No mesmo período,
nos bairros periféricos, os muito
satisfeitos foram de 2% para 1%.
Por outro lado, o percentual de
pessoas que responderam não haver parques públicos na área em
que vivem aumentou, na cidade
em geral, de 34% para 39%. No
extremo sul, ele é maior e permaneceu praticamente estável: foi de
44% para 45%. No meio termo, os
que se dizem satisfeitos com os
parques existentes aumentaram
de forma geral (de 21% para
29%), mas diminuíram na periferia, indo de 24% para 20%.
O grau de insatisfação preocupa
quando comparado ao que os entrevistados relataram ser os problemas mais graves do bairro onde vivem: desemprego, uso de
drogas, falta do que fazer e alcoolismo, nessa ordem de importância e sem grandes diferenças entre
os paulistanos em geral e os que
vivem nas regiões mais pobres.
"Está tudo inter-relacionado",
resume a psicóloga social Nancy
Cardia, coordenadora da pesquisa e do NEV. Ela lembra que não
ter o que fazer deriva, por um lado, do desemprego e, por outro,
da falta de opções de lazer, cultura
e esporte. Já as drogas e o álcool
são meios atraentes para tentar
fugir de uma realidade que combina excesso de tempo livre e poucas perspectivas de vida.
As principais vítimas ainda são,
diz Cardia, crianças e adolescentes, mas o arquiteto Paulo Brazil
Esteves Sant'Anna, diretor do Núcleo de Aplicação da Escola da Cidade, lembra que a cidade está envelhecendo e precisa oferecer alternativas de qualidade também
ao tempo livre dos idosos.
As opiniões colhidas nos distritos da zona sul, defende Cardia,
poderiam ser transpostas, em linhas gerais, para os extremos leste e norte da cidade, já que lá também faltam parques públicos.
"As políticas públicas têm o costume de beneficiar as áreas nobres. O parque Ibirapuera recebe
constantes investimentos. Não
sou contra teatro nem fonte, mas
por que não destinar esses investimentos a parques como o Guarapiranga [no sul da cidade], que está abandonado e em uma área carente?", questiona João Sette
Whitaker Ferreira, pesquisador
do LabHab (Laboratório de Habitação e Assentamentos Urbanos)
da Faculdade de Arquitetura e
Urbanismo da USP.
Verde contra a aridez
E por que mesmo os que não vivem em áreas periféricas estão
descontentes com os parques que
têm? Cardia e Ferreira defendem
que São Paulo se tornou "árida",
"inóspita" e "se desumanizou"
com a perda das áreas verdes comuns, que cederam lugar aos prédios e às ruas asfaltadas.
Isso se reflete diretamente na
degradação da qualidade de vida
das pessoas e deteriora a relação
que elas passam a ter com a cidade, num círculo vicioso que termina, todos os fins de semana, em
congestionamentos nas rodovias
que levam ao litoral e ao interior.
Mas não adianta fazer dos parques ilhas de verde em meio a
uma cidade com a qual eles não se
integram, nem criá-los sem o envolvimento da comunidade, que
precisa ajudar a mantê-los, diz
Sant'Anna. Até porque parques
abandonados viram mato e, em
vez de evitar a violência, tornam-se seu palco preferido.
(MV E RP)
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