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São Paulo, terça-feira, 25 de fevereiro de 2003

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DIA DE TERROR

Tráfico teria jogado bombas, incendiado ônibus e ameaçado lojistas; 16 pessoas foram feridas

Ações criminosas deixam Rio em pânico

Ana Carolina Fernandes/Folha Imagem
Ônibus queimado visto de dentro de outro ônibus incendiado em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense


Sérgio Moraes/Reuters
Membros do esquadrão antibombas em Ipanema


MARIO HUGO MONKEN
TALITA FIGUEIREDO

DA SUCURSAL DO RIO

A seis dias do principal acontecimento turístico do Rio, o Carnaval, uma série de ações supostamente organizadas pela facção criminosa Comando Vermelho causou pânico em pelo menos 23 bairros da capital e a outros cinco municípios do Grande Rio. A maioria das ações ocorreu perto de favelas dominadas pelo CV.
Iniciada na madrugada de ontem, a onda de violência deixou 16 pessoas feridas, duas delas em estado grave, 34 veículos incendiados (entre ônibus, carros e caminhão) e oito depredados.
Apesar de o governo estadual ter anunciado o reforço do policiamento, as ações criminosas seguiam à noite: às 19h, ameaças de supostos traficantes do morro do Cantagalo fecharam um supermercado em Ipanema, bairro nobre da zona sul; às 20h, moradores do morro Engenho da Rainha tentaram saquear outro supermercado, em Pilares (zona norte).
De manhã, seis bombas caseiras foram arremessadas contra prédios em Ipanema, contra um ônibus e contra um supermercado. Por causa de ameaças e da propagação do medo, comércio e escolas de diversos bairros fecharam. Vinte e dois suspeitos de participar dos atentados foram presos.
A Polícia Civil atribui a ação ao traficante Luiz Fernando da Costa, o Fernandinho Beira-Mar, um dos líderes do CV, preso na penitenciária Bangu 1 (zona oeste).
Segundo policiais, Beira-Mar estaria revoltado com o tratamento que tem recebido no presídio, onde não estaria conseguindo se comunicar por meio de telefone celular, o que era rotineiro antes da instalação dos bloqueadores, no ano passado. Outra razão para os ataques seriam recentes operações policiais que resultaram na apreensão de celulares nos presídios Bangu 3 e 4, que abrigam presos do CV.
Uma carta, supostamente divulgada pela facção criminosa, foi distribuída ontem em diferentes pontos da cidade. O texto diz que as ações foram uma reação à violência policial nas favelas.

Ipanema
Eram 5h quando se ouviu um estrondo em Ipanema. Segundo testemunhas, um grupo de seis pessoas, em três motos, jogou três bombas de fabricação caseira e uma granada de efeito moral -que não explodiu- contra quatro prédios da avenida Vieira Souto, que fica à beira-mar.
Apenas o prédio de número 420 foi atingido. Fragmentos de uma das bombas abriram um buraco no muro do edifício e atingiram a janela do apartamento 101, estilhaçando parte do vidro.
Parte das lojas baixou as portas em Ipanema -nos quarteirões mais próximos ao morro do Cantagalo. "A gente sente no ar que alguma coisa está errada. Cheguei para trabalhar às 8h, e a lanchonete onde todos os comerciantes daqui tomam café não havia aberto. Dizem que foi ordem do Beira-Mar", relatou o gerente da loja Fotológica, Adilson da Silva.
A ação mais grave ocorreu em Botafogo (zona sul). Um grupo jogou uma garrafa de coquetel molotov em um ônibus da linha 410 (Saens Penha-Gávea), próximo ao morro Dona Marta. O ônibus foi incendiado e 13 pessoas ficaram feridas, das quais duas correm risco de morte. Aury Maria do Canto, 70, internada em coma no hospital Souza Aguiar (centro), está com 25% do corpo queimado e a perna esquerda fraturada. Valeska Marinho Duarte, 30, teve 60% do corpo queimado.

Tiros na estação de trem
A 65 km dali, a estação de trem de Santa Cruz (zona oeste), uma das mais movimentadas do Rio, ficou fechada por três horas devido a um tiroteio entre PMs e traficantes. Ninguém ficou ferido.
A primeira ação registrada pela polícia ocorreu às 4h10, em Benfica (zona norte). Pelo menos 50 homens com fuzis e pistolas fecharam a av. Dom Hélder Câmara e a r. Leopoldo Bulhões e incendiaram quatro ônibus e cinco carros. O grupo também assaltou motoristas e passageiros e fugiu dando tiros para o alto.
O auxiliar técnico Édson Alves Barbosa, 48, que dirigia um carro com o logotipo da CEG (Companhia Estadual de Gás), disse que o grupo decidiu incendiar seu veículo quando viu o nome da empresa. "Eles falaram "toca fogo que é do governo"."
Um trocador de um dos ônibus incendiados afirmou que, a todo momento, o grupo gritava "Beira-Mar, Beira-Mar".
A onda de violência também atingiu outras áreas da zona norte. Em Ramos, na estrada do Itararé, próximo ao complexo de favelas do Alemão, carros e ônibus foram apedrejados, o que levou a PM a interditar a via pela manhã. No Jacaré, um caminhão com alimentos foi saqueado.
O comércio ficou fechado em vários bairros. Na Tijuca, três grandes supermercados não abriram, assim como dois no Engenho Novo. Nas ruas, homens de motocicleta passavam ordenando o fechamento das lojas. Os protestos continuaram na parte da tarde, quando houve registros de ônibus incendiados na zona norte, em Niterói e na Baixada Fluminense.


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