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Para antropóloga, poder público subestimou capacidade de organização dos criminosos
Pesquisadores vêem acúmulo de erros
MÁRIO MAGALHÃES
DA SUCURSAL DO RIO
O dia de terror no Grande Rio
foi possível em virtude de erros e
problemas que as políticas de segurança pública acumularam em
décadas. O manifesto no qual a
facção criminosa CV (Comando
Vermelho) supostamente assume
a autoria das ações, dando-lhe
roupagem social com verborragia
esquerdista, é mera retórica sem
base política real.
As duas opiniões são comuns a
quatro professores de três universidades do Rio consultados pela
Folha. Sobram divergências em
relação a outros aspectos.
A antropóloga Alba Zaluar, do
Instituto de Medicina Social da
Uerj (Universidade do Estado do
Rio de Janeiro) e até julho assessora de Segurança Participativa
da Prefeitura do Rio, afirma que o
poder público subestimou a capacidade dos ""comandos" de ""se
manterem e se reproduzirem"
dentro da prisão.
Para a socióloga Julita Lemgruber, há uma ""ausência vergonhosa" do Estado em comunidades
que acabam tomadas pelo tráfico
de drogas. Chefe do sistema penitenciário de 1991 a 1994 e ouvidora de Polícia de 1999 a 2000, ela dirige o Centro de Estudos de Segurança e Cidadania da Universidade Cândido Mendes.
O sociólogo Michel Misse, coordenador do Núcleo de Estudos da
Cidadania, Conflito e Violência
Urbana da UFRJ (Universidade
Federal do Rio de Janeiro), diz
que ""num país cheio de problemas, a área criminal foi relegada a
segundo plano".
O antropólogo Gilberto Velho,
do Museu Nacional da UFRJ,
aponta um problema suplementar: ""Saímos do regime militar
[1964-85] e temos dificuldade de
lidar com a idéia de segurança".
Segundo Julita Lemgruber, o que
agrava a situação é o enfrentamento aberto, com o panfleto.
"Ainda não haviam formalizado
reivindicações e ameaças."
Para Velho, ""perdeu-se o controle da situação. O Rio e a Baixada Fluminense são um caso limite". Misse vê as ações como indício de ""isolamento" do tráfico. ""A
violência deles não vai acuar a cidade; a reação será maior."
Lemgruber acha provável que
os traficantes tenham reagido a
dificuldades para operar sem restrições na prisão. Zaluar não acredita na hipótese. Velho suspeita
de intenção de ""demonstrar força" nos eventos de ontem.
Zaluar aposta que o avanço das
organizações do tráfico ""vai contaminar outros Estados". Ela destaca que a carta-manifesto denuncia a violência policial nas favelas, mas omite o terror que a
guerra do tráfico impõe. "Alguns
colegas [de academia] e movimentos como o hip-hop só condenam a violência policial."
Misse chama a atenção para o
retorno do CV ao discurso político do início do grupo, na virada
dos anos 70 para os 80.
Secretário de Segurança no governo Fernando Henrique Cardoso, José Vicente da Silva Filho
diagnostica um fator a mais: ""O
Rio teve duas trocas traumáticas
de governo em menos de um ano.
Não houve uma transição pacífica
e a descontinuidade na cúpula e
os atritos causam paralisia na polícia. O tráfico percebe muito bem
esses sinais. Essa paralisia abriu
uma avenida para o tráfico agir".
Colaborou MARIO CESAR CARVALHO, da Reportagem Local
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